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Edições Anteriores 91 Conto de fadas - Uma experiência no processo de alfabetização com crianças das classes populares
Conto de fadas - Uma experiência no processo de alfabetização com crianças das classes populares PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Ana Maria de Paula Siqueira   
Qua, 19 de Abril de 2006 21:00

INTRODUÇÃO - A essência da escrita aqui apresentada é mostrar como ocorreu a assimilação dos mecanismos de leitura e escrita, para o exercício da cidadania, num grupo de crianças das classes populares que, por caminhos pedagógicos inovadores superaram com "sucesso o fracasso escolar", com uma experiência feita a partir da reescrita de textos tipo "contos de fada". Minha experiência como alfabetizadora, capacitadora da Fundação para o Desenvolvimento da Educação, no Curso de Alfabetização Teoria e Prática, e, como Assistente Técnico Pedagógico do Ciclo Básico de Alfabetização, ajudou-me na coleta e compilação de vários dados, justificando a desmistificação de "fracasso escolar" entre as crianças das classes populares.Durante a investigação trabalhamos com 8 classes e professores de Ciclo Básico de Alfabetização, e aproximadamente 200 crianças ( sem pré-escola e retidos) com uma proposta construtivista de alfabetização, para crianças das classes populares. Com encontros semanais, durante o período do Curso de Alfabetização Teoria e Prática, fundamentamo-nos nas teorias de Jean Piaget, Emília Ferreiro, Henri Wallon, Lev Vygotsky, Ana Teberosky, Telma Weissz e outros, para discussão, reflexão, análise e realização das atividades de reescrita dos contos de fada, feitas em sala de aula. Estas atividades criativas feitas pelas crianças resultaram, a princípio, em grande fonte de possibilidades para o prosseguimento das investigações, pois boa parte delas mostrava que, no repensar da prática, juntamente com o professor poder-se-ia propor outras alternativas de trabalho no cotiano escolar Assim, numa atividade coordenada de preparo, aplicação, acompanhamento e avaliação do cotidiano do professor pudemos observar como as crianças na escola democrática, apropriam-se da escrita passando a utilizá-la num contexto extra-escolar.

METODOLOGIA - Partindo da premissa de que a construção de conhecimentos é tarefa que cabe particularmente ao professor, procurou-se discutir durante o Curso as seguintes questões: a).- o problema da alfabetização nas classes populares: b).- o trinômio teoria/ preconceito /mito - "crianças das classes populares não aprendem"; c).- o professor como interventor da aprendizagem, na formação de leitores e escritores: d).- a construção do conhecimento, baseada nos teóricos construtivistas , aliando teoria aplicada à prática; e).- o uso dos textos tipo Conto de Fadas, para atingir a produção de outros textos coesos e coerentes ; f).- materiais alternativos para um trabalho engajado com o projeto do curso; g.)- sugestões de atividades aliando teoria à prática; h)- enfim a aquisição e o domínio da leitura e escrita. Como ponto de partida foram propostas atividades com as quais os professores já estavam habituados, para não lhes tolher a liberdade de ação pedagógica. Para nortear o trabalho do professor priorizamos: Texto - Produção Oral (a ênfase na oralidade tinha como intuito valorizar a competência lingüística da criança, enquanto falante da língua materna); Texto - Produção Escrita (como os professores tivessem compreendido que as crianças podiam ler e escrever, mesmo antes de adquirirem os mecanismos básicos de leitura e escrita, ficava claro que só se aprende a ler lendo, e, só se aprende a escrever escrevendo, o que tornou natural a relação da criança com a escrita. As crianças, a princípio, deveriam ouvir um conto narrado pelo professor e reescrevê-lo. Posteriormente um conto deveria ser assistido pela televisão e reescrito, e, finalmente numa outra etapa, tentar fazer a leitura e escrita de um conto através da Literatura Infantil. Optamos por sortear algumas escritas das crianças para compor o "corpus" de nossa apresentação.

" Cinderela
Era rei um filia e rei se caso.
O rei morreu e a Cinderela ficou com a madasta.
A madasta ficava chemmendo a Cinderela
Cinderela cinderela javou javou.......
Cinderela que ir comigo no baile meninas mispere e
Secolar é meu e se vistido é meu
- fada madrinha pegou a vara majica e empeistou o vistido
cinderela meia noite voce ficara sem o vistidio
e sem a caroça e votaralnormau........
e ela foi a obaile e dansou com prisipi
O jaé meia noite euprisiso eu vou imbora
O ratinho pegou a xave do bonso e subiu ea prio
O quarto e ela saio
E vivio felizes para senpre"
Patrícia Juliana - 7 anos.
" O macaco e a velha
A velha morava lainsima do moro.
E na casa e na frente tem o jardim
E a trais da casa tem pé de bananeiras
Eai jatava madurinas e não da papega as banana.
Eai ela viu o macaco paseando e xamou o macaco.
Seu macaco filo da mãe
Sadai sua boneca senão vou tida um tapa pau
Misouta sua boneca senão vou tida uma tapa prau".
Antonio Fábio - 12 anos.
Nas reescritas acima as marcas da oralidade podem ser vistas no lugar de parágrafos, ortografia, pontuações e entonações. As crianças ainda não conheciam os recursos que a língua lhes oferece, hipotetizavam e faziam uso da oralidade transcrevendo-a. Outras marcas puderam ser vistas quando as crianças buscavam a norma culta para o seu discurso, tais como parênteses, aspas, travessão, interrogação, muitas vezes colocados no texto, talvez, mais por hipótese estética ou espacial, do que para a verdadeira intenção.

RESULTADOS - Após a análise de várias produções, colocava-se ao grupo que, ao professor, enquanto interventor no processo ensino-aprendizagem, caberia mostrar às crianças que quando se substitui as marcas da oralidade por recursos que são próprios ao texto, estes lhes possibilitariam uma estrutura mais clara de reescrita e daria maior qualidade às suas produções. Nosso objetivo era que a escola atuasse no sentido de que a criança aprendesse a ler e a escrever a partir dos contos de fada, para se tornar um produtor de textos, inserindo-se num contexto social mais amplo. Dessa maneira, nossa proposta com o grupo era de que a escrita deixasse o seu aspecto exclusivamente escolar, pensar, representar, comunicar com prontidão, para se tornar reconstrução, construção e redefinição da prática pedagógica do professor. Colocar conteúdo de ensino/professor, tendo como base a escola e o seu Plano de Trabalho, e, o trabalho professor/aluno em sala de aula, constituiu um grande desafio para o grupo, pois o conhecimento teórico que mostrava uma grande distância entre a teoria e a prática, tornou-se objeto de reflexão sobre o ensinar e aprender na escola. Assim, o trabalho do grupo abriu várias possibilidades de reflexão para mudanças sobre o processo de aprender na escola, e o entendimento pedagógico como opção por essa ou aquela teoria, como instrumental para organização de sua ação como educador, compreendendo o aluno como sujeito da aprendizagem. As teorias dos autores construtivistas contribuíram para que os professores entendessem a forma como ocorre o aprendizado, os objetivos da educação básica formal, e como fazer a sua intervenção pedagógica, no processo de aquisição de leitura e escrita. Portanto, baseando-se em teorias construtivistas, o grupo pôde analisar como se dá o processo de alfabetização, a compreensão desse processo, buscando saber que concepções de língua escrita a criança tem, e como usá-la como função social. Assim num trabalho com o uso de textos do tipo contos de fadas pudemos observar como as crianças se apropriaram da escrita passando a utilizá-la num contexto extra-escolar. Vejamos nos exemplos a seguir o uso da escrita como função social, em cartas enviadas pelas crianças, à varias pessoas:

Estou escrevendo-lhe esta cartinha para pedir: para eu e meus colegas ir para a Fundação... Não vamos fazer nenhuma bagunça. Porque na Fundação é lugar de gente sibilesada. Tem que ser esse mês porque no outro, nós não sabemos se a professora falta?. Bruno 9 anos - Carta - Diretor da Fundação para o Desenvolvimento da Educação

"Papai Noel eu gostaria muito de ganhar uma barbi, sempre eu quis, só que nuca pude Ter e também queria que minha mãe comprasse uma casa e queria que logo o meu pai arrumasse emprego, e o me patrinho resolvese logo os ploplemas da aposentadoria porque isso da uma dor de cabeça" Débora - 10 anos.

CONCLUSÃO- Através desse uso observamos ainda , que as informações obtidas através da apreensão, apropriação e transformação de significados oriundos dos contos de fada, num mundo cheio de milagres, mostravam às crianças que cada informação contida na língua escrita nos contos, servia agora para a comunicação. Esta comunicação, bem como a construção do conhecimento se deveu às atividades até então desenvolvidas com a oralidade, a leitura e a escrita, que reciprocamente se entrelaçaram para que atingíssemos o objetivo: leitura e escrita de texto. Essa aprendizagem que consideramos significativa, muito mais que decorrência de um processo de maturação intelectual, permitiu a construção de um processo de auto-descoberta e um exercício de vontade de constituir-se uma via de acesso aos bens culturais e ao exercício da cidadania, por crianças das classes populares, que se iniciaram no processo de Alfabetização.


BIBLIOGRAFIA
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BETTELHEIM, Bruno - A Psicanálise dos Contos de Fada - RJ, Paz e Terra, 1978.
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COSTA, D. A F. - Fracasso Escolar: diferença ou deficiência? - Porto Alegre, Kuarup, 1994.
FERREIRO, E. & TEBEROSKY - Psicogênese da Língua Escrita - Porto Alegre, Artes Médicas, 1986.
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GERALDI, j.w. - Portos de Passagem - SP, Martins Fontes, 1993.
JOLIBERT, J. - Formando Crianças Leitoras- Tradução Bruno Charles Magne, RS Artes Médicas, 1994.
JOLIBERT, J - Formando Crianças Produtoras de Textos - Tradução Walkiria F. Setti- nerii e Bruno Charles Lagne, RS, Artes Médicas, 1994.
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VYGOTSKY, Lev S. - Pensamento e Linguagem - SP, Martins Fontes, 1991.
WALLON, H. - As Origens do Caráter da Criança -tradução de Heloysa Dantas S. Pinto, SP, Nova Alexandria, 1995.
____________ - As Origens do Pensamento da Criança- SP, Manole, 1989.
____________ - Psicologia e Educação da Infância - Lisboa, Editorial Estampa, 1975.
WEISZ, T. - Por Trás das Letras - In , Programas I, II, III e IV, SP, FDE/CENP,1992.



 

Autor deste artigo: Ana Maria de Paula Siqueira - participante desde Dom, 09 de Abril de 2006.

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