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Promovendo Saúde Emocional, Mental e Social de Crianças e Adolescentes em Contexto Educacional. PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Maria Solange Siqueira   
Ter, 26 de Março de 2013 00:00

Maria Solange Siqueira

Resumo

 

O presente trabalho constitui uma reflexão e intervenção para a prevenção, promoção ou a redução da violência entre e com adolescentes no contexto escolar, incluindo a participação da família ou responsável, de professores e instituição escolar, envolvendo aspectos sociais, a partir de referenciais da área da Psicologia. Participaram deste estudo trinta e oito jovens do ensino fundamental, do sexo feminino e masculino, faixa etária de onze para quinze anos de idade, com dificuldades de ensino-aprendizagem, dificuldades nas relações interpessoais e de comunicação. As atividades realizadas foram desenvolvidas em locais habituais para os adolescentes: a sala de aula e, quando necessário, o pátio da escola, a biblioteca e o refeitório, onde aconteceram as oficinas. Pais ou responsáveis também se envolveram. Valendo-nos de pesquisa qualitativa, realizamos atendimentos e discussões em grupo com os familiares a cada mês, com técnicas de terapia familiar e de grupos operativos, além do trabalho psicopedagógico grupal com os adolescentes mediado por recursos expressivos no contexto escolar, analisando cada produção desenvolvida pelos alunos nos encontros semanais. Também foram considerados documentos e informações de um modo geral. O presente estudo apresenta uma síntese dos pontos mais relevantes das produções realizadas, das características do desenvolvimento da adolescência, da atuação dos educadores e dos familiares, visando a contribuir para o entendimento da violência e sua redução no contexto escolar.

 

Palavras-chave: Violência, escola, adolescente.

 

 

Introdução

Apesar do surgimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990, tratando a criança e o adolescente como sujeitos de direitos e em pleno desenvolvimento, ainda ocorrem diversas manifestações de violência contra essa população mais vulnerável da nossa sociedade, mais especificamente no contexto educacional. O que deve suscitar a mobilização e responsabilidade de pais ou responsáveis, bem como de todos os integrantes da instituição escolar, em criar um contexto afetivo favorável ao desenvolvimento saudável para esses meninos e meninas, baseado numa relação de confiança, respeito, autonomia e criatividade. Requer esforço, vontade e criatividade para implementar ações conjuntas de diversos agentes sociais para prevenção da violência e consolidação da justiça social.

Nos últimos tempos, as sociedades ocidentais vêm difundindo os seus valores pelo mundo num processo que se chama GLOBALIZAÇÃO. Isso tem modificado bastante antigos controles comunitários sobre a vida dos indivíduos e, consequentemente, a maneira como eles concebem suas relações com o espaço, o tempo, a produção, levando-os a buscar o preenchimento de vazios existenciais por meio de determinados produtos ou situações.

No primeiro encontro com os pais dos alunos explicamos como seria nosso trabalho. Cientes da preservação da identidade dos envolvidos, eles assinaram o termo de consentimento para a participação dos filhos. Em seguida, realizamos o cadastro com informações pessoais de cada aluno. Realizamos em 2012 quarenta e quatro atendimentos com os alunos, além de quatro encontros grupais com os pais.

Nosso trabalho incluiu atividades de sensibilização que possibilitaram a interação e troca de experiências, a reflexão sobre as possibilidades de promoção de saúde para os jovens, bem como o estabelecimento de vínculos positivos interpessoais entre o grupo de adolescentes no ambiente escolar, familiar e social.

Lançamos mão de atividades e recursos artísticos, expressivos, projetivos, como o desenho temático e associações deles, mobilizando um novo cenário transicional disponível para a criatividade narrativa grupal, conforme defende Winnicott (1975) ao se referir à importância do objeto transicional para a criança como etapa necessária e de suporte para o seu desenvolvimento.

 

Objetivo

O objetivo deste trabalho é estudar o fenômeno da violência contra e entre adolescentes em Instituição Escolar e promover a saúde mental, emocional e social, analisando formas de intervenção e avaliação, a partir do diagnóstico, da avaliação e da construção da subjetividade.

 

Justificativa

Este artigo nasceu também da realização de um trabalho psicoeducativo com 160 adolescentes do ensino médio, no interior de São Paulo, em 2012, inserido em um projeto de prevenção ao uso abusivo de substâncias psicoativas por crianças e adolescentes, a partir de diagnóstico de alto índice de violência e uso de substâncias psicotrópicas, inclusive no contexto escolar. Por tratar-se de um estudo com caráter de intervenção, pode contribuir efetivamente para a vida pessoal dessa população atendida e sua família, para a comunidade do entorno escolar e, ao aliar teoria e prática, para o mundo acadêmico.

 

Fundamentação Teórica

Nossa visão de mundo implica a seleção de quais objetivos e meios trabalharemos para mediar e formar nossos alunos, que muitas vezes, de acordo com Delors[1], estão excluídos, com carências diversas, como privação de cultura e afeto, e em situação de vulnerabilidade física, psíquica e econômica.

No ambiente escolar, observamos uma demanda dos alunos que solicitaram serem compreendidos e aceitos pelos professores e pela escola, exigindo respostas da instituição e uma formação do educador que envolve uma complexidade de qualidades abordadas por Feurstein (in: Tébar, 2011), como competência pedagógica, equilíbrio emocional, compreensão das fases de desenvolvimentos dos jovens e abertura para mudanças.

Os familiares em sua maioria apresentaram dificuldades pessoais e sociais que os impossibilitaram de assumir os seus papéis, delegando-os para a escola. Os conflitos a serem superados teriam de ser encarados não apenas  pelos familiares como pela instituição escolar, uma vez que estes familiares apresentaram menor compreensão da complexidade dos relacionamentos sociais, dos papéis parentais e sobre o atendimento às necessidades de si e do outro.

A família atualmente assume novas configurações: estão presentes os irmãos e tios, os avós ou a figura feminina separada do marido e que precisa se preparar para assumir o seu papel e permitir que seus filhos, enteados ou outros desenvolvam-se cognitiva e emocionalmente em seu processo de maturação, oferecendo-lhe apoio, compreensão, regras e condutas claras, com afetividade, em favor da vida saudável.

O comportamento agressivo dos alunos parecia estar associado a suas realidades vividas, a situações de conflitos psíquicos característicos do processo de desenvolvimento deles, à busca do pai ou mãe interno (biológico ou não), pois alguns padrastos assumiram a paternidade, outros abusaram desses filhos ou viveram em estado lastimável por causa do envolvimento com drogas lícitas ou ilícitas, revelando conflitos intrafamiliares, entre eles  desentendimento conjugal, comunicação inadequada, dificuldade em dar  amor, em estabelecer limites e regras claras de conduta, crianças de famílias com histórias intergeracionais de abuso e baixo status socioeconômico, bem como dificuldades no ambiente educativo, além do modelo cultural de referência familiar e comunitária. Uma família com esse perfil apresenta uma configuração de desequilíbrio, agravado pelo sentimento de aprovação da violência (por punição corporal, por exemplo) contra tais jovens pela sociedade.

Entretanto, é na relação de transferência, implícito nas obras de Bleger (1980), seja com os alunos, seja com a equipe educativa e os familiares, que o terapeuta assume o papel de objeto subjetivo, podendo desenvolver um contato com experiências transformadoras e significativas.

Seifer (1970) pontua como defesa da vida, no sentido de ensinar as habilidades psicofísicas e sociais para os filhos, como importante para a formação da criança, ao longo de seu desenvolvimento até a maturidade adulta. É esperado que os responsáveis pela criança mostrem autoridade, mediante sua experiência de vida, ajudando-a a compreender a fantasia e a realidade. A função de colocar limites constitui o limite psíquico de interdição necessário para a estruturação psíquica para a contenção dos impulsos destrutivos, tanto da autoagressão ou da agressão em relação a outros, e que foi acontecendo com o grupo de alunos no decorrer desse trabalho, entre outros motivos pelas suas dificuldades internas e externas, o que propiciou a falta de controle e a emergência da agressão. Esta situação exprime no aparelho psíquico, através da fantasia, os instintos de vida e de morte, conforme a teoria de Freud, enquanto os atos vão mostrar a realidade entre aquilo que leva à morte ou mantém a vida.  Também está implícito isso nas obras de Levisky (2001).

Para Azevedo e Guerra (1989), uma criança que convive com a violência doméstica ou ameaça do pai contra a mãe, como aconteceu em diversas situações, segundo relatos dos familiares durante os encontros na escola, é uma criança que necessita de proteção, já que a mulher agredida pode descontar sua raiva e frustração na criança; esta por sua vez pode machucar-se tentando proteger sua mãe e, finalmente, a criança que testemunha a agressão contra a própria mãe poderá tornar-se um adulto agressor ou uma mulher agredida mediante o processo de representação desse modelo.

Entretanto, Klein (1996) menciona que o ato de fazer reparação é necessário, importante e inerente em todas as relações.

Dessa forma, trabalhamos com variados e alternados recursos, além dos temas trazidos pelos integrantes deste estudo. Recriamos na fantasia deles o amor e a bondade, a partir de vivências nas relações em contextos diversos, como um desejo de receberem o amor que tiveram de seus pais na primeira infância, ou como gostariam de ter recebido deles, ou até mesmo como gostariam de ter feito, podendo ser uma maneira de lidar com os sofrimentos do passado, ou seja, reparar na mente os danos que tiveram ou fizeram na fantasia ou no real.

Tardivo (2011) pontua que a desigualdade social brasileira favorece a vulnerabilidade das nossas crianças e adolescentes, colocando-os em risco em todos os sentidos. Um dos fatores de risco associado à ocorrência de violência infantil, da adolescência ou de negligência é a pobreza, situada em um ambiente de estresse gerador de conflitos situacionais diversos, comprometendo o desenvolvimento dos jovens, como observado nessa pesquisa. Outro fator de risco é a história e personalidade dos pais, no sentido de como foram desenvolvidas e estão suas estruturas de personalidade, que podem apresentar instabilidades e fixações em alguma fase do seu desenvolvimento, acarretando egocentrismo e imaturidade no entendimento de seus papéis de cuidadores e em relação a suas habilidades, tornando-os mais negativos, punitivos e com menos suporte na educação de seus filhos, dificultando assim a reversão do quadro citado acima e expresso pelos grupos de familiares.

Por meio da transferência, foi possível refletir como cada aluno percebeu o outro e como todos se constituíram na relação entre eles. Em grupo, eles assumiram muitas vezes, conforme o olhar de Maffesoli (1987), um sentimento de poder, prevalecendo a perda do individualismo em favor do coletivo, aderindo a novos papéis com novas atitudes de um personagem ideal. Dessa forma, este grupo manifestou inquietações relacionadas às suas experiências de buscas, sonhos e frustrações com os seguintes temas nos encontros das oficinas propostas, que se transformaram em conteúdos simbólicos (subjetividade): sexo, namoro, racismo, preconceito, bullying, frustração, homossexualidade, família, rejeição, abandono, humilhação, violência, roubo, drogas, maus tratos, perdas, sonhos, expectativas e medos.

De acordo com Melanie Klein (1991), as perdas, tanto no sentido de uma pessoa real como de outros tipos de perdas que aconteceram entre os participantes desse trabalho, permitiram que eles revivessem através do trabalho de luto a restauração do objeto de amor perdido da primeira infância, instalando-o dentro de si mesmo, assim como todos os seus objetos amados internos que tiveram o sentimento de ter perdido, passando por um processo psíquico de recuperá-los.

Um dos fatores que auxilia a superação das perdas é quando a criança ou adolescente consegue internalizar no início de sua vida uma mãe protetora, favorecendo o sentimento de segurança em seu mundo interior.

Foi possível desenvolver um trabalho em conjunto com os pais ou responsáveis e os professores desses alunos, no sentido que atribui Benghozi (1995), de percebermos que a sintomatologia da violência apresentada no contexto escolar muitas vezes origina-se, entre outros fatores, no ambiente familiar e educacional, exigindo uma nova maneira de relacionamento, com comprometimento de todos os envolvidos para uma reestruturação relacional interpessoal, familiar e escolar.

 

Conclusão

 

Foi possível reduzir os fatores de risco que interferiam no desenvolvimento biopsicossocial desses jovens neste período de suas vidas em que conviviam com a violência em seu ambiente familiar, educacional e comunitário mediante o aumento dos fatores de proteção, fortalecendo a estrutura psíquica e vínculos interpessoais, intrafamiliar, escolar e comunitário, possibilitando a construção da subjetividade e identidade deles para o desenvolvimento e aquisição de autonomia, de seus direitos e de justiça social no processo de cidadania.

 

 

 

Referências Bibliográficas

BENGHOZI, P.. Malhagem, filiação e afiliação. Psicanálise dos vínculos: casal, família, grupo, instituição e campo social (trad. Eunice Dutra Galert) 1. São Paulo: Vetor, 1995.

BLEGER, J.. Temas de psicologia: entrevista e grupos. São Paulo: Martins Fontes, 1980.

FERRARI, D.C. A.; VECINA, T. C. C. (Orgs) O fim do silêncio na violência familiar: teoria e prática. São Paulo: Ágora, 2002.

FREUD, Sigmund. (1905 [1901]). Fragmento de análise de um caso de histeria. In: Edição Standard  Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Vol. VII. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

______ (1912). A dinâmica da transferência. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas  Completas de Sigmund Freud. Vol. XII. Rio de Janeiro: Imago, 1996, pp. 107-119., 1996.

KLEIN, Melanie. Inveja e gratidão e outros trabalhos (1946-1963). Tradução da 4ª ed. inglesa – Elias Mallet da Rocha, Liana Pinto Chaves (coordenadores) e colaboradores – Rio de Janeiro: Imago, 1991.

______. Inveja e gratidão. Rio de Janeiro: Imago, 1995. X JORNADA APOIAR - O LABORATÓRIO DE SAÚDE MENTAL E PSICOLOGIA CLÍNICA SOCIAL- 20 ANOS: O PERCURSO E O FUTURO – Instituto de Psicologia da USP 23 de Novembro de 2012

ANAIS DA X JORNADA APOIAR - LEILA SALOMÃO DE LA PLATA CURY TARDIVO & TÂNIA MARIA JOSÉ AIELLO VAISBERG (ORGANIZADORAS)

______. (1991). Amor,  culpa e reparação e outros trabalhos (1921-1945). Com uma nova introdução escrita por Hanna Segal; tradução de André Cardoso Rio de Janeiro: Imago.

AZEVEDO, M.A GUERRA, V. N. Violência doméstica na infância e na adolescência. São

Paulo: Robe Editorial, 1996.

LEVISKY, D. W. (Org.). Adolescência e violência: ações comunitárias na prevenção “conhecendo, articulando, integrando”– São Paulo: Casa do Psicólogo/Hebraica, 2001.

MAFFESOLI, M.. Dinâmica da violência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987.

TÉBAR, L. O perfil do professor mediador: pedagogia da mediação. Tradução de Priscila Pereira Mota – São Paulo: Senac, 2011.

WINNICOT, D, A família e o desenvolvimento individual. Tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

______ O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.

TARDIVO, L.S.P.L.C, Brasil, Coordenadora do Laboratório APOIAR, IX Jornada Apoiar Promoção de vida e vulnerabilidade social na América Latina: reflexões e propostas, grupos de risco de crianças e adolescentes em países da América latina. In: Psicologia: Universidade de São Paulo, em 03 de dez, 2011.

 


[1]TÉBAR, Lorenzo. As mudanças necessárias na educação. In: O perfil do professor mediador: pedagogia da mediação. Tradução de Priscila Pereira Mota. São Paulo: Senac, 2011.

 

Autor deste artigo: Maria Solange Siqueira - participante desde Qua, 14 de Novembro de 2012.

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