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Escrito por Jose Claudio Rocha   
Ter, 23 de Julho de 2013 00:00

José Cláudio Rocha[1]

A lição sabemos de cor

Só nos resta aprender!!!

Sol de Primavera

Beto Guedes

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

O presente artigo foi redigido a partir da Conferência de abertura intitulada “Ciência e Ética no Século XXI”, proferida na XVI Jornada de Iniciação Científica da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) que em 2012 teve o tema “Eu, a Ciência e o Mundo”. As reflexões aqui presentes são fruto do trabalho de investigação científica de pelo menos 05 (cinco) anos do Grupo de Pesquisa Gestão, Educação e Direitos Humanos (GEDH) sobre temas como ética, desenvolvimento sustentável e direitos humanos. O GEDH é um grupo de pesquisa multi-institucional e multidisciplinar que congrega pesquisadores do Brasil e de outros países com o objetivo de desenvolver pesquisas que colaborem para a resignificação da educação e do direito como instrumentos de transformação social.

 

 

2. INICIAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

 

Antes de adentrarmos no tema da Conferência, ou seja, na relação entre ética, ciência e pesquisa, cabe destacar alguns aspectos referentes à importância da iniciação científica e tecnológica no cenário da Ciência, Tecnologia e Inovação do país. O Brasil vive um momento especial, a estabilidade econômica e política, a dimensão e recursos naturais do seu território, o tamanho da população, a diversidade regional e cultural e o atual estágio de desenvolvimento científico e tecnológico do país dão ao Brasil hoje as condições para ingressar de vez no time das grandes economias mundiais, proporcionando desenvolvimento e qualidade de vida para o seu povo.

Para que isso ocorra, no entanto, dentro de um modelo de desenvolvimento sustentável com respeito à cidadania e à democracia, é preciso que o país invista na pesquisa, ciência, tecnologia e inovação para enfrentar os grandes desafios nacionais. Em outras palavras a criatividade e a inovação cumprem um papel estratégico nas economias mundiais e só através do desenvolvimento da pesquisa, principalmente, na pós-graduação é que obteremos nos resultados não só desejados, mas necessários, sob pena do Brasil continuar sendo o país de um futuro que nunca chega.

O investimento em ciência e tecnologia passa, sobretudo, pela formação de recursos humanos de alto nível e as agências de fomento como a CAPES e o CNPq apontam que o melhor caminho para esse fim, é o investimento na formação de jovens talentos através dos programas de iniciação cientifica e tecnológica.

A iniciação cientifica e tecnológica é, portanto, o primeiro passo na formação do pesquisador que depois participará de programas de mestrado, doutorado e pós-doutorado, contribuindo com o desenvolvimento da pesquisa e a formação de novos recursos humanos para o país.

O Brasil já ocupa a 13ª posição no ranking mundial na publicação de artigos científicos, mas quando falamos em produção tecnológica (patentes, marcas, indicação geográfica, cultivares), ocupamos modesta 86ª posição. O novo Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) – 2011 a 2020 – prevê que nos próximos anos o Brasil fique entre os dez primeiros países em produção de artigos científicos, isto é, na produção de conhecimento novo, e melhore em muito a aplicação do conhecimento através da pesquisa tecnológica, favorecendo o crescimento de todas as formas de proteção à propriedade intelectual.

Como exemplo disso podemos citar a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) criada de forma acertada para impulsionar a pesquisa no Brasil. A EMBRAPA foi fundamental não só para garantir a segurança alimentar do país, como gerou riqueza a partir da exportação de produtos agropecuários. A EMBRAPA hoje é uma rede com cerca de dez mil funcionários e dois mil e quinhentos pesquisadores com foco no desenvolvimento do país.

Em todos esses aspectos a iniciação cientifica e tecnológica terão um papel fundamental no cumprimento dessas metas pelo país. É preciso, portanto, promover uma verdadeira revolução educacional em que a iniciação cientifica e tecnológica façam parte, vivemos nessa época em que o conhecimento é o principal ativo das economias desenvolvidas e o país precisa investir, cada vez mais, para que seus jovens tenham interesse pela ciência, tecnologia e inovação como estratégia de desenvolvimento do Estado.

Por este motivo o estudante que pretende progredir na carreira acadêmica e profissional deve buscar os programas de iniciação cientifica de sua Instituição de Ensino Superior (IES) como uma forma de acumular novas experiências. Da mesma forma o programa ciência sem fronteiras deve ser utilizado pelos estudantes para troca de experiências e conhecimento com grupos sediados em universidades de outros países. Todas essas experiências, sem a menor dúvida fortaleceram a ciência, tecnologia e inovação no Brasil.

Por fim, destaco outra grande missão da iniciação cientifica e tecnológica, pensando na formação de equipes para implantação de programas de pós-graduação, a iniciação cientifica e tecnológica são importantes instrumentos para que jovens mestres e doutores adquiram experiência na orientação de alunos para depois integrar o corpo de professores de um programa de pós-graduação, favorecendo a formação de recursos humanos em nosso país para a universidade e empresa.

 

3. ÉTICA, CIÊNCIA E PESQUISA

 

Feita essa preliminar, vamos agora ao mérito da questão, ou seja, a relação entre ética, ciência e pesquisa no século XXI. De início podemos dizer que a abordagem desse tema na Jornada de Iniciação Cientifica parte de uma preocupação mundial com a resignificação da ética nas relações humanas, inclusive, na pesquisa. Do ponto de vista geral, vivemos uma crise ética, como afirma o professor Edgard Morin: “a humanidade vive uma sede de ética”[2] .

Em verdade, a opinião pública, principalmente, na América Latina tem cobrado por todos os canais possíveis um comportamento ético de seus dirigentes em todas as áreas, bem como, que a distribuição de recursos públicos seja feita a partir de critérios éticos. Na pesquisa isso não é diferente.

Tivemos no Brasil e no mundo durante muito tempo um paradigma de desenvolvimento centrado apenas no crescimento econômico que, sem a menor dúvida, trouxe grandes problemas para a humanidade do ponto de vista social e ambiental, basta para isso vermos o atual estágio de degradação ambiental do planeta.

Por outro lado, escândalos mundiais envolvendo chefes de Estado como Collor no Brasil e Fujimori no Peru, assim como casos de corrupção no mundo corporativo como a gigante do setor elétrico americano Enron, levaram a que as escolas de negócio no mundo inteiro refletissem sobre a reintegração do ensino da ética nos currículos de suas casas, pensando com isso melhorar o nível ético da formação de seus egressos. Em outras palavras, precisamos de gestores, professores, pesquisadores e cidadãos mais éticos.

Estudos desenvolvidos por Bernardo Kliksberg[3] no livro Mais Ética, mais Desenvolvimento, publicado pela UNESCO no Brasil, nos mostram que o respeito a valores éticos nas decisões de gestão representam um importante componente para as economias mundiais e que comportamentos anti-éticos são altamente nocivos a economia dos países. Kliksberg traça uma nítida correlação entre pressupostos éticos e valor do IDH das nações.  A Noruega é um exemplo de que a sociedade que respeita seus valores éticos alcança um maior nível de desenvolvimento humano.

Contrariando esse sentido, as visões predominantes na América Latina são aquelas que dissociam ética de economia, sugerindo que são mundos diferentes, com suas leis próprias, sendo a ética uma ciência do espírito. Esse tipo de concepção que marginaliza os valores éticos, também afirma ser o comportamento ético ineficiente, quando acontece justamente o contrário, ou seja, são os comportamentos anti-éticos que são altamente prejudiciais ao desenvolvimento humano, econômico e social.

No campo da pesquisa, a crise ética também está presente, a pressão por produção cientifica está levando a uma reflexão sobre o lugar da ética na pesquisa e na produção do conhecimento. A resignificação da ética para o desenvolvimento e para a pesquisa é, portanto, um movimento recente em nossa região (América Latina), fruto de uma resposta a série de escândalos envolvendo corrupção e malversação de recursos na região.

 

4. ANTECEDENTES HISTÓRICOS


No que diz respeito à relação entre ética e ciência, podermos afirmar que essas duas coisas nascem juntas e a sua cisão vai acontecer muito tempo depois já na idade moderna, fruto de uma ideologia que apregoou ser a ciência uma forma neutra de produção do conhecimento.

As investigações empíricas da realidade no mundo ocidental são descritas desde a antiguidade, primeiro os sofistas, depois os filósofos socráticos romperam com o pensamento mítico como forma de conhecer a realidade dando origem ao chamado pensamento racional.

Considerado o primeiro filósofo sofista, Tales de Mileto buscava explicar o universo a partir de um elemento único a água. Tempos depois o filósofo socrático Aristóteles publicou mais de quinhentos documentos sendo considerado o primeiro filósofo e cientista a sistematizar estudar e registrar suas descobertas.

Aristóteles desenvolveu estudos sobre ética, biologia e zoologia construindo assim as bases de sua ciência, algumas descobertas de Aristóteles no campo da biologia só puderam ser provadas já no século XIX, muito tempo depois de sua morte. Antigamente, os filósofos que investigavam a natureza chamavam a si mesmo de filósofos naturais. Nesse momento, ética e ciência andavam juntas, faziam marte do mesmo ideal de vida da humanidade.

A cisão entre ética e direito vai acontecer já na idade moderna fruto da Revolução Científica que aconteceu no século XVI e XVII na Europa. A partir desse momento a ciência que até então andava junto com a filosofia, separou-se desta e passou a ser um conhecimento mais estruturado e prático. Com a referida revolução, a ciência mudou sua forma e sua função, passando a ser repensada nos moldes na nova sociedade que estava emergindo nesta época. Os objetivos do homem da ciência e da própria ciência acabaram sendo redirecionados para uma era livre das influências místicas da idade moderna.

Essa visão da ciência perdurou durante todo o século XIX e boa parte do século XX, mas depois da segunda guerra mundial a humanidade voltou a perceber que não é possível conceber a ciência sem a baliza da ética. Os horrores praticados durante a segunda guerra mundial e a ciência sendo utilizada como instrumento para causar sofrimento às pessoas levou a que a comunidade internacional fortalecesse a idéia de re-ligação de saberes e uma resignificação da ética.

 

5. ÉTICA NO SÉCULO XXI

 

Com o século XX temos a emergência de um novo paradigma para a gestão pública, fundado no respeito aos valores modernos dos direitos humanos, no respeito à democracia participativa (cidadania) e na valorização do desenvolvimento sustentável. As teorias da complexidade e da transdisciplinaridade trouxeram novos elementos a essa discussão, cada vez mais a ciência enxerga a interligação entre as coisas e a impossibilidade concreta de  criar uma fronteira entre a ética e a ciência.

Questionamos hoje como influenciar a ética dos agentes primários do desenvolvimento, isto é, cidadãos, empresas comerciais, governos e também oposição, meios de comunicação e mercado. Isso nos leva a uma reflexão sobre o modelo civilizatório que fundamenta nosso atual modelo de desenvolvimento. Sem embargo, os graves problemas econômicos sociais mundiais e a corrupção e autoritarismo presentes no cenário político internacional colocam em xeque o modelo de civilização que estamos construindo e qual desenvolvimento queremos com ele.

Há na atmosfera de nossos tempos algo que soa falso e nos alarma. Será que devemos resignar-nos ao fim dos pensamentos universalistas, ao reino versátil da democracia de opinião. Ao novo dogmatismo do mercado total ou da tecnologia, ao desaparecimento definitivo das utopias e da esperança. O que temos por trás desse discurso, enquanto novas formas de dominação, desigualdades que se aprofundam, enquanto o princípio de humanidade naufraga.

Todos esses perigos nos encontram estranhamente desarmados, depois de um século marcado por tiranias, loucuras e ruínas, não sabemos como enfrentar os desafios no campo ético para o século XXI. Nós estamos “desacreditando tudo” e nos desencantamos muito rapidamente.

Nesse aspecto, cultivar a ética entre as pessoas e organizações é fundamental. Assim como a flor precisa de água, luz e calor, a humanidade precisa para sobreviver de ética, amor e alegria. E tem que regar todos os dias.

Nesse sentido, a ética está no amor ao outro, na alteridade no reconhecer a diferença e no valorizar da diferença e da diversidade. O cultivo da tolerância entre os seres humanos por meio da convivência pacífica é um desafio cotidiano para todos nós. Nesse processo, a educação é uma ferramenta indispensável ao processo civlizatório. Contudo, o projeto pedagógico deve ser orientado para uma perspectiva ético-humanista sob pena de naufragarmos em nossas expectativas.

Temos poucas normas no campo da ética na pesquisa, a principal delas é a Resolução 196 – 96 que trata dos procedimentos para a realização de pesquisas em seres humanos. Essa resolução tem como orientação os principais documentos internacionais que tratam da dignidade humana, mas já se sabe que essa norma não é suficiente para atender todos os tipos de pesquisa, principalmente, as pesquisas no campo das ciências humanas. Será preciso, sem a menor dúvida, um marco legal e regulatório mais elaborado. Temos a convicção de que a discussão da ética em relação a pesquisa e o desenvolvimento são de grande importância para a humanidade e devemos estimular eventos em que essa dimensão possa ser mais explorada.

 

Bibliografia

 

KLIKSBERG, Bernardo. Mais Ética, mais Desenvolvimento. UNESCO/SESI, Brasília, 2008.

[1] MORIN, Edgard. Estamos em um Titanic. Disponível em http://pensamientocomplejo.com.ar. Acesso em 02.11.212.

ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. In: ROCHA, J. C. Guia de Educação em Direitos Humanos. UNEB, Camaçari, 2009.

ROCHA, J.C. A Reinvenção solidária e participativa da universidade. EDUNEB, Salvador, 2008.

ROCHA, J.C. Teoria do Estado democrático. EDUNEB, Salvador, 2009.

 


[1] Advogado, Economista e Professor Universitário. Especialista em Administração Pública e em Ética, Capital Social e Desenvolvimento. Pós-Graduado em Direitos Humanos, Mestre e Doutor em Educação. É professor da graduação, mestrado e doutorado e pró-reitor de pesquisa e ensino de pós-graduação.

[2] MORIN, Edgard. Estamos em um Titanic. Disponível em http://pensamientocomplejo.com.ar. Acesso em 02.11.212.

[3] KLIKSBERG, Bernardo. Mais Ética, mais Desenvolvimento. UNESCO/SESI, Brasília, 2008.

 
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