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Edições Anteriores 86 O alcance efetivo da gratuidade do ensino superior nas Instituições de Educação Superior Públicas
O alcance efetivo da gratuidade do ensino superior nas Instituições de Educação Superior Públicas PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Gustavo Fagundes   
Qua, 15 de Março de 2006 21:00

Em decorrência de manifestação recente acerca da gratuidade do ensino superior nas instituições de educação superior públicas, apontando para a ilegalidade da cobrança de taxas de inscrição e matrícula, bem como de mensalidades nos cursos e programas ministrados por tais instituições, surgiram dúvidas sobre o tema, essencialmente em virtude de suposto conflito entre o teor do Parecer CES/CNE n° 364/2002 e do Parecer CES/CNE n° 143/2004, bem como em virtude do disposto no art. 208 da CF aparentemente garantir a gratuidade no ensino público somente até o nível do ensino médio.

Todavia, considero que tais dúvidas, na verdade, não se traduzem em qualquer empecilho para a manutenção das conclusões já apresentadas sobre o tema, inclusive no que pertine à impossibilidade de cobrança dos programas de pós-graduação lato sensu.

Desnecessário fazer nova incursão na seara das inúmeras decisões jurisprudenciais sobre a questão, posto que chega a ser exaustiva a elencação já constante do estudo anterior sobre o tema, de modo que a presente manifestação será limitada à análise das dúvidas acima suscitadas.

Por uma questão metodológica, este trabalho será iniciado pela análise da questão constitucional suscitada.

Com efeito, segundo alguns questionamentos surgidos recentemente, o art. 208 da CF/88 limitaria a imposição da gratuidade do ensino público ao nível do ensino fundamental, de modo que inexistiria obrigatoriedade desta gratuidade nas IES públicas, sendo que este entendimento permitiria o seu elastecimento a ponto de que tal gratuidade atingisse também o ensino médio.

Entretanto, uma leitura mais atenta dos dispositivos constitucionais pertinentes, quais sejam, o art. 206 (inciso IV) e o art. 208 (incisos I e II) da Carta Magna, é capaz de afastar eventuais dúvidas sobre a questão, motivo por que se mostra adequada a transcrição de ambos:

"Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
.....
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;". (grifamos).
"Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
.....
I - ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II - progressiva universalização do ensino médio gratuito;".
(grifamos).

Destarte, surge o entendimento de que o "ensino fundamental obrigatório e gratuito" mencionado no inciso I do art. 208 da CF/88 é um dever do Estado, até porque, logo adiante, o § 1° do mesmo dispositivo estabelece que "o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo".

Vale dizer, é obrigação inafastável do Estado proporcionar a todos os brasileiros o acesso ao ensino fundamental obrigatório e gratuito, ou seja, é impositivo constitucional a freqüência ao ensino fundamental, incumbindo ao Estado assegurar este direito público subjetivo de forma obrigatória e gratuita.

Estamos, portanto, diante de um dever do Estado, ou seja, de um mínimo a que o Poder Público se encontra constitucionalmente obrigado a atender.

Também, nesta esteira, é dever do Estado promover a "progressiva universalização do ensino médio gratuito", o que equivale dizer que, além da obrigação imediata do Poder Público de prover o acesso obrigatório e gratuito ao ensino fundamental, possui ainda a obrigação mediata de promover a universalização desse acesso para o nível de ensino médio.

O dever do Estado de propiciar aos brasileiros, de forma imediata, o ensino fundamental obrigatório e gratuito, e de forma mediata o ensino médio, contudo, não afeta o princípio constitucional insculpido no inciso IV do art. 206, segundo o qual o ensino público, em qualquer de seus níveis, deve ser gratuito.

Conclui-se que o dever básico do Estado, traduzido pelo mínimo constitucionalmente exigível do Poder Público, é o fornecimento de ensino fundamental obrigatório e gratuito a todos os brasileiros, inclusive àqueles que não tiveram acesso a ele no devido tempo, sendo parte integrante deste dever, porém não de forma imediata, promover a universalização do ensino médio gratuito.

Não obstante a existência deste dever mínimo, e ao lado dele, a Constituição estabelece o princípio da gratuidade do ensino público nos estabelecimentos oficiais (art. 206, IV), segundo o qual, além de cumprir seu dever mínimo de oferecer ensino fundamental obrigatório e gratuito, o Estado também se encontra impedido de cobrar pela prestação dos serviços de ensino público, independentemente do nível de ensino ministrado.

Entendo, portanto, inexistir contradição alguma entre os dispositivos constitucionais mencionados, porquanto o art. 206, inciso IV, consagra o princípio da gratuidade do ensino público, ao passo que o art. 208, incisos I e II, impõem ao Estado a obrigação de, no mínimo, assegurar a todos os brasileiros o acesso ao ensino fundamental obrigatório e gratuito e, num futuro breve, também universalizar o acesso ao ensino médio gratuito.

Cabe agora abordar a questão da alegada contradição entre os termos do Parecer CES/CNE n° 364/2002 e do Parecer CES/CNE n° 143/2004, questão esta que também pode ser solucionada por intermédio da análise mais acurada do teor de ambos os pareceres.

Com efeito, a análise do inteiro teor de ambos os pareceres leva à conclusão de que, antes de serem contraditórios, eles são, na realidade, complementares.

O Parecer CES/CNE n° 364/2002 trata da regularidade da cobrança de taxas em cursos de pós-graduação lato sensu, concluindo que, diante do caráter notadamente de especialização e aperfeiçoamento destes, bem como por não conferirem grau acadêmico, não se constituem em atividade regular de ensino e, portanto, não estariam albergados pela norma constitucional que assegura a gratuidade do ensino público, nos seguintes termos:

"III CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta consulta traz à discussão a classificação dos cursos de pós-graduação no Brasil e a terminologia adotada entre nós para caracterizar as diversas modalidades como foram sendo criadas no País. A implantação significativa de cursos de mestrado, inclusive os profissionalizantes, de extração mais recente, e doutorado, na última década, assim também o oferecimento dos cursos de especialização e de aperfeiçoamento, especialização pelas IES privadas, trouxe, na prática e de forma marcante, a necessidade de fixar-se a diferença apresentada pelas terminologias então adotadas - 'stricto e lato sensu'.

Como a graduação, os cursos de mestrado e doutorado acentuam o caráter de regularidade de que se revestem as atividades acadêmicas desenvolvidas em processos formais. Os cursos de extensão, como aquelas atividades inscritas com as características de especialização e de aperfeiçoamento, entretanto, incluem-se como prática do que mais recentemente se integrou à universidade, a educação permanente ou continuada.

De certa maneira, os cursos de especialização em todas as formas previstas, os de aperfeiçoamento e até os de extensão, fazem parte de um mesmo grupo de educação continuada, cujas características principais são a oferta descontínua, episódica e, na maioria dos casos, não acadêmica, conduzindo a certificado. "Vale dizer, tais cursos contrastam com definição de ensino, aproximando-se, muito mais, do conceito de extensão", conforme argumenta a Informação SESu, número 57, anteriormente mencionada, o que tem levado, por decorrência, à compreensão de que se tratam de cursos livres que independem, exceto no caso de entidades não educacionais, de prévia autorização e de continuada supervisão.

Ao contrário dos cursos de especialização que levam a certificado, a oferta dos programas de mestrado e de doutorado, em seguimento à graduação, visa a aprofundar a formação científica ou cultural. São regulados por diversos instrumentos deste Conselho, em consonância com a CAPES e se caracterizam pela regularidade da oferta, pela atividade acadêmica e de pesquisa e conduzem a diploma, conferindo grau acadêmico aos concluintes, e, por estas razões, se incluem no grupo de cursos de pós-graduação, sentido estrito.

Registre-se manifestação da CAPES sobre o tema: '0 Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG), na acepção adotada pela CAPES, é o conjunto de cursos de mestrado acadêmicos e profissionais e de doutorado avaliados por esta agência e reconhecidos pelo CNE. Desta forma, o SNPG é constituído exclusivamente por cursos que, por demonstrarem nível de qualidade que atende às exigências da formação pós-graduada para obtenção de graus acadêmicos, podem expedir diplomas de validade nacional. 'Trata se, obviamente, de uma conceituação restritiva no sentido de que abrange apenas: a) cursos de pós-graduação stricto sensu e b) que tenham sido avaliados pela CAPES e aprovados e reconhecidos pelo CNE. Ou seja, o SNPG é visto como o sistema oficial da pós-graduação stricto sensu, onde os cursos são cadastrados, tem acompanhamento anual, avaliação trienal e têm suas características acadêmicas e administrativas divulgadas pela CAPES. 'Cursos de especialização (pós-graduação lato sensu) não são avaliados nem acompanhados pela CAPES. 'Portanto não integram o Sistema Nacional de Pós-Graduação.'
Com base na Informação apresentada pela SESu, objeto principal deste Parecer, e com base nos argumentos desenvolvidos ao longo deste Relatório, a Comissão acolhe as seguintes considerações trazidas pelo Coordenador Geral de Legislação e Normas do Ensino Superior, exaradas em sua Informação, de número 57, de 17 de Julho de 2002, e aqui repetidas com diminuta adaptação.

I) 'o ensino de graduação e Pós-graduação stricto sensu ministrado pelas Universidades públicas deve ser gratuito, em expresso cumprimento ao dispositivo constitucional;
II) 'os cursos de especialização e aperfeiçoamento, ou seja, de pós-graduação lato sensu, não se configuram como atividade de ensino regular e, por conseguinte, tem-se por correta a cobrança efetuada, pelas universidades públicas pelos instrumentos que, no exercício de sua autonomia constitucional definirem.

IV VOTO DO RELATOR
Com base no exposto, parte integrante do presente voto, e nos termos do art. 90, da Lei 9.394/96 e da Informação CGLNES/SESu 57/02, à qual incorporamos a este, concluímos favoravelmente à regularidade da cobrança de taxas em cursos de pós-graduação lato sensu, ministrados pelas Instituições Federais de Ensino Superior.

Brasília (DF), 6 de novembro de 2002.
Conselheiro Edson de Oliveira Nunes Relator
Conselheiro Jacques Schwartzman
Conselheiro Roberto Cláudio Frota Bezerra

V DECISÃO DA CÂMARA
A Câmara de Educação Superior aprova, por unanimidade, o voto dos membros da Comissão.
Sala das Sessões, em 6 de novembro de 2002."
(grifou-se).
Posteriormente, o Parecer n° CNE/CES 0143/2004 tratou de responder questionamento formulado pelo Ministério Público Federal, por intermédio da Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, manifestando-se acerca da cobrança de taxas em programa de Mestrado oferecido por IES pública.

O Parecer em comento, portanto, trata da irregularidade da cobrança de taxas em cursos de pós-graduação stricto sensu, concluindo que, diante do caráter notadamente de educação continuada, bem como por conferirem grau acadêmico, se constituem em atividade regular de ensino e, portanto, estariam albergados pela norma constitucional que assegura a gratuidade do ensino público, nos seguintes termos:

"II - VOTO DO RELATOR
Em vista do exposto, voto pela seguinte resposta à Procuradoria da República do Rio Grande do Sul:

1. A exigência de que os candidatos selecionados apresentem, no ato da matrícula dos cursos de Mestrado Profissional, uma declaração da organização concordando com sua contribuição para a dotação orçamentária necessária à implantação do curso contraria o princípio da igualdade de condições de acesso ao ensino, expresso na Constituição Federal, em seu Art. 206, inciso I.

2. Os cursos de Mestrado Profissional pertencem à categoria das atividades regulares de ensino mantidas por instituições de ensino superior públicas e, devem ser oferecidos gratuitamente, em cumprimento ao inciso IV do Art. 206 da Constituição Federal.
Brasília-DF, 16 de junho de 2004.

Conselheiro Paulo Monteiro Braga Vieira Barone - Relator.

III - DECISÃO DA CÂMARA
A Câmara de Educação Superior aprova o voto do Relator com abstenção da Conselheira Marilena de Souza Chauí.
Sala das Sessões, em 16 de junho de 2004." (grifamos).

Vale registrar que os Pareceres mencionados não se mostram conflitantes ou contraditórios, haja vista que o Parecer CES/CNE n° 364/2002 trata especificamente da situação da possibilidade de cobrança de taxas nos cursos de pós-graduação lato sensu ministrados pelas IES públicas, ao passo que o Parecer CES/CNE n° 143/2004, adotando inclusive fundamentação harmônica com o anterior, trata exclusivamente de apontar para a impossibilidade de cobrança de taxas nos cursos de pós-graduação stricto sensu ministrados pelo mesmo tipo de instituição de educação superior.

Evidentemente, não é a mera inexistência do aparente conflito entre os mencionados Pareceres que leva à necessária conclusão da adequação de seus termos à legislação vigente, sobretudo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n° 9.394/1996.

Com efeito, a Lei n° 9.394/96 não traz este tipo descabido de distinção entre os cursos e programas de educação superior, conforme se pode verificar do teor de seu art. 44, verbis:
"Art. 44. A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas:
I - cursos seqüenciais por campo de saber, de diferentes níveis de abrangência, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de ensino;

II - de graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e tenham sido classificados em processo seletivo;

III - de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, cursos de especialização, aperfeiçoamento e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino;

IV - de extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas instituições de ensino." (grifamos).

Verifica-se claramente que a Lei n° 9.394/96 não traz a pretendida distinção entre os diversos cursos e programas que compõem a educação superior entre "regulares" e "irregulares", ou entre "profissionais" e "acadêmicos".

Ora, se ministrados por instituições de ensino superior devidamente credenciadas pelo órgão competente, e se atendidas as demais normas pertinentes, força é admitir que todos os cursos e programas de educação superior são, indiscutivelmente, atividades regulares.

Esta discussão se mostra até descabida, haja vista que, a teor do disposto no art. 66 da própria Lei n° 9.394/96, mesmo os cursos de pós-graduação lato sensu (especialização), desde que ministrados em conformidade com a Resolução CES/CNE n° 01/2001, são considerados regulares e seus certificados tem validade nacional, inclusive para fins de exercício do magistério, verbis:

"Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado." (grifamos).

Apenas para colocar fim a esta discussão, cumpre lembrar que o Parecer CES/CNE n° 213/2004 esclarece que os parâmetros que distinguem as modalidades de pós-graduação lato sensu "especialização, aperfeiçoamento e outros" devem ser definidos pelas próprias instituições de educação superior nos termos da Resolução CES/CNE n° 01/2001, e que a Portaria MEC n° 328/2005 instituiu o Cadastro de Pós-Graduação Lato Sensu, consagrando que este tipo de curso é atividade regular de ensino, inclusive por fazer parte do cadastro de órgão oficial, no caso o INEP.

Dessa forma, parece esclarecida a questão acerca da cobrança de taxas de inscrição e matrícula, assim como de mensalidades por parte das IES públicas, concluindo-se que as atividades regulares de ensino, aí incluídas a graduação e as pós-graduações lato sensu e stricto sensu não podem ser objeto de cobrança, sob pena de haver violação ao princípio constitucional da gratuidade do ensino público, insculpido no inciso IV do art. 206 da CF/88.

Em relação às aparentes contradições entre os artigos 206, inciso IV e 208, inciso I, ambos da Constituição Federal de 1988, entendemos ter restado demonstrada a harmonia entre ambos, porquanto, à medida em que os incisos I e II do art. 208 estabelecem um dever, uma obrigação mínima a ser cumprida pelo Poder Público (oferta de ensino fundamental obrigatório e gratuito de forma imediata e de ensino médio, este de forma mediata), o inciso IV do art. 206 consagra o princípio da gratuidade do ensino público em todos seus níveis.

Da mesma forma, a aparente contrariedade entre o Parecer CES/CNE n° 364/2002 e o Parecer CES/CNE n° 143/2004 se esclarece pela análise do conteúdo de ambos, de onde se conclui que, antes de antagônicos, os mencionados Pareceres são complementares, haja vista que, enquanto um deles conclui pela possibilidade de cobrança de taxas nos cursos de pós-graduação lato sensu pelas IES públicas (Parecer 364/02), o outro conclui pela vedação de cobrança nos programas de pós-graduação stricto sensu destas mesmas IES (Parecer 143/04).

Esta diferenciação, como consta do teor de ambos os Pareceres, deve-se essencialmente ao fato de os cursos de pós-graduação lato sensu não serem, pelo entendimento defendido pelo Conselho Nacional de Educação, considerados atividades regulares de ensino, haja vista seu alegado caráter de especialização e aperfeiçoamento profissional, ao passo que os cursos de pós-graduação stricto sensu são considerados atividades regulares de ensino, em virtude de seu caráter acadêmico.

No entanto, esta diferenciação apontada pelo Conselho Nacional de Educação, como já apontado, não está prevista na Lei n° 9.394/1996, que não contém diferenciação no sentido pretendido entre os diversos tipos de cursos e programas compreendidos no âmbito do ensino superior.

Destarte, entendo permanecer válido o entendimento já manifestado em diversas ocasiões, no sentido de ser ilegal a cobrança de quaisquer tipos de taxas por parte das instituições públicas de educação superior como contraprestação pela oferta de cursos e programas de educação superior, bem como por parte de suas fundações de apoio.

 
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