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SINAES: DIFERENÇAS ENTRE A PROPOSTA E SUA IMPLANTAÇÃO |
Escrito por Wille Muriel |
Seg, 26 de Novembro de 2012 12:03 |
Roberta Muriel / Wille Muriel / Charles Leão. Núcleo de Estudos sobre Avaliação Institucional (NEAI) do MBA – Administração Acadêmica e Universitária
Atualmente, discute-se a educação do futuro a partir da sociedade do conhecimento e da condição humana nesta sociedade. “A educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana”. (MORIN 2004, p. 47). A educação é o principal meio de desenvolvimento do cidadão e da sociedade. Por razão, torna-se fundamental garantir o acesso ao ensino superior, a permanência daqueles que tiveram acesso e a oferta de uma educação de qualidade. A qualidade deve ser vista como um princípio. Medir a qualidade em educação é, todavia, tarefa complexa, que exige grande esforço para que possa ser considerada válida, na medida em que a educação é um fenômeno social. Portanto, muitas de suas dimensões não são facilmente mensuráveis. Averiguar qualidade é um dos objetivos do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), proposto pelo Ministério da Educação (MEC), o qual busca integrar em um único sistema a avaliação de cursos, a avaliação das Instituições de Ensino Superior (IES) e a avaliação dos alunos, o que ocorre por meio do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (ENADE).
Percebe-se, porém, nítido distanciamento entre a proposta do SINAES e aquilo que ocorre atualmente nos processos de regulação. Questiona-se: Em que medida os instrumentos de avaliação atualmente utilizados ajudam na implantação adequada dos processos avaliativos realizados nas Instituições de Ensino Superior no Brasil? Esse distanciamento prejudica a eficácia e a eficiência do SINAES. Eficácia, na medida em que se faz a coisa certa, o que precisa ser feito, cuja busca, entendida como resultado positivo ou como problema solucionado, não deve seguir atalhos incertos ou procedimentos de emergência que mudam o foco da ação para atender às possibilidades, relegando as reais necessidades a segundo plano; e eficiência, na medida em que é o caminho mais inteligente, mais direto, mais econômico, e por isso o melhor caminho possível para alcançar os objetivos. Mas a eficiência não se justifica por si própria, e, assim, a eficácia torna-se um norte para a eficiência; ou seja, alcançar os resultados da melhor maneira possível (OLIVEIRA, 2004). Tomando-se o conceito de eficiência como a utilização dos recursos da melhor maneira possível, não é produtivo pensá-lo sem estabelecer uma conexão direta com a eficácia, pois o empenho dos recursos e sua lógica só se justificam se organizados para alcançar o objetivo - ser eficaz. A avaliação de instituições e a avaliação de cursos da maneira como ocorrem utilizam-se de instrumentos de avaliação com dimensões, indicadores e critérios. Pela análise destes instrumentos, à luz do conceito de eficiência, é possível chegar a algumas conclusões. Tomemos como exemplo a Dimensão 1 do Instrumento de Avaliação Institucional Externa: Missão e Plano de Desenvolvimento Institucional, na qual existem dois indicadores de avaliação com a definição de um referencial mínimo para cada um deles:
Com base na dimensão do planejamento utilizada como exemplo para esta tem-se que dois indicadores apenas não são suficientes para avaliar com precisão se a IES planeja para atender à eficiência. Outros fatores são igualmente ou mais relevantes para esta análise. Por exemplo: se o planejamento é conhecido pelos colaboradores da IES ou se os objetivos são alcançados. Da maneira como foi proposta, é possível perceber que dimensão avalia parcialmente o planejamento que ocorre na IES e apura como esta atividade contribui para melhorar a eficiência da gestão. Reconhece-se que há alguma contribuição, mas ainda há muito a se desenvolver em relação aos instrumentos para que possam contribuir de forma mais significativa para a gestão da IES. Tomemos agora o Instrumento “Avaliação de Curso de Graduação” e a dimensão corpo docente. Utilizam-se para a análise alguns indicadores que apresentam critérios mais objetivos:
a) Conceito 5: Quando o percentual dos docente do curso com titulação obtida em programas de pós-graduação stricto sensu é superior ou igual a 75%.
a) Conceito 5: Quando o percentual do corpo docente previsto / efetivo com regime de trabalho de tempo parcial ou integral é superior ou igual a 80%.
a) Conceito 5: Quando pelo menos 50% dos docentes tem mais de 9 produções nos últimos três anos.
Os indicadores analisados anteriormente não foram concebidos para avaliar objetivamente a gestão sob o prisma da eficiência. Somente alguns geram informações neste sentido, enquanto outros se voltam para aspectos não diretamente relacionados à eficiência. Para compreender exatamente a contribuição da avaliação para a eficiência da gestão das IES de modo geral, torna-se necessário colocar em evidência cada instrumento, dimensão, indicador e critério, e analisá-los sob esta ótica. Da maneira como foi proposta a avaliação de cursos, percebe-se alguma contribuição para uma gestão eficiente, mas a eficiência não é o foco de análise desta avaliação, e, assim, a contribuição é eventual, podendo ou não ocorrer com base na interpretação dos resultados dos indicadores. Pode-se, ainda, verificar a relação dos Instrumentos de Avaliação com os princípios que caracterizam a proposta do SINAES: a) Educação como um direito social e um dever do Estado - Há na dimensão terceira do Instrumento de Avaliação Externa um conjunto de indicadores de responsabilidade social, mas o peso desta dimensão no conceito geral da avaliação não é representativo. De outro lado, o Indicador de Qualidade de cursos, o Conceito Preliminar de Curso (CPC), provoca um ranking das instituições e promove um conceito geral do que é bom e do que não é bom, como uma prestação de contas do Estado regulador e supervisor para a sociedade. O problema ocorre quando os conceitos não apresentam fundamento técnico consolidado, mas são assumidos pela opinião pública como referenciais de qualidade da oferta educacional. Assim, a avaliação acaba não cumprindo bem esta intenção. b) Valores sociais historicamente determinados - Não há um objetivo sistêmico nem uma concepção geral do papel da educação para o desenvolvimento do País, e isso também não é sugerido ou avaliado pelo sistema com base nos instrumentos que têm sido utilizados. O modelo, a partir do estabelecimento de rankings, incentiva o sentido da concorrência, e não o da colaboração. O que pauta essas ações é a ideia de economia de mercado, da oferta educacional como mercadoria. c) Regulação e controle - Esta política foi estabelecida pelas diretrizes do SINAES, mas tem sido mal implantada, com pouca articulação com o setor privado, que responde por 75% das matrículas, e com o mercado de trabalho. Não há uma preocupação genuína com a articulação entre Estado, Mercado e Comunidade. d) Prática social com objetivos educativos - Da forma como é realizada, a avaliação não leva a uma produção de sentidos, mas a restrições de oferta, punições e retaliações públicas. A avaliação fica na fotografia, na constatação de fatos, mas não indica parceria e nem ações de melhoria. e) Respeito à identidade e à diversidade institucionais em um sistema diversificado - A padronização dos instrumentos de avaliação provoca a busca por padrões comuns na oferta educacional. Assim, a avaliação implantada, além de não considerar a diversidade contribui para que esta não se estabeleça, sem considerar todos os malefícios dessas práticas, em que o critério de determinação das políticas avaliativas se estabelece em função muito mais da capacidade de operação do MEC do que das necessidades de reconhecimento do sistema diverso. f) Globalidade - Há globalidade, na medida em que os instrumentos de avaliação se articulam e as dimensões criam conceitos globais sobre todo o sistema. Mas o advento do CPC sobrepôs a opinião do aluno às demais posições sobre a qualidade da oferta educacional no ensino superior brasileiro. Assim, quebrou-se o caráter global da avaliação. g) Legitimidade - Não se observa legitimidade nos atores da avaliação; as propostas de avaliação externa não se sustentam tecnicamente; a maneira como são executadas não promove a valorização da imparcialidade ou da transparência; há grande variabilidade na ação dos avaliadores; e o próprio Ministério da Educação não observa os princípios e os valores propostos pelo sistema. A valorização de momentos na avaliação por parte de seus agentes revela: ocorrência de revanchismos por parte dos alunos; falta de compromisso com o momento da avaliação; e, em alguns casos, até pelas circunstâncias, omissão de dados e informações por parte das IES. Tudo isso enfraquece o sistema quanto à sua legitimidade. h) Continuidade - Há clara intenção de continuidade na proposta do SINAES, e a maneira como a avaliação é implantada indica a ideia de continuidade, tanto externa quanto interna. Mas a continuidade não se estabelece completamente sem a consideração dos demais princípios do Sistema. E, assim, sem observá-los, a própria continuidade pode ser muito ruim; ou seja, continuar com aquilo que não tem funcionado bem e dentro dos princípios que foram propostos. De alguma forma, embora os princípios apontados estejam presentes na proposta do SINAES, da maneira como ela se estabelece os penduricalhos criados para operacionalizá-la a burocratizam e atrapalham significativamente a observância destes princípios em nível razoável. A implantação de uma avaliação educativa nas Instituições de Ensino Superior com o sentido colaborativo conforme propõe o SINAES poderia trazer para o setor respostas que impulsionariam seu desenvolvimento, aspecto determinante para o crescimento do País. É importante investir no aprimoramento dos instrumentos de avaliação e da consciência tanto de avaliadores quanto de avaliados sobre a importância e o caráter formativo do processo de avaliação como uma ferramenta fundamental para a gestão das IES. |