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Gestão Universitária

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Educação Corporativa e a empregabilidade do trabalhador PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Rodrigo Buzin Siqueira do Amaral   
Qui, 16 de Fevereiro de 2012 00:00

Rodrigo Buzin Siqueira do Amaral

Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial de São Paulo (SENAC/SP)

Administrador Público, Especialista em Gestão Educacional e Mestre em Educação.

RESUMO

 

O estudo desenvolvido se deteve sobre o Programa de Educação Corporativa de uma Instituição educacional integrante do chamado “Sistema S” de São Paulo. Tem como objetivo analisar o Programa de Educação Corporativa e seu impacto na melhoria das condições de empregabilidade dos ex-funcionários da Instituição.  Lançamos mão do estudo de caso, utilizando análise documental e bibliográfica e entrevistas com ex-funcionários da Instituição. Contrapomos à idéia da Educação Corporativa ser capaz, sozinha, de contribuir para o aumento da chamada empregabilidade do trabalhador.

 

 

Palavras-chave: educação corporativa, trabalho e educação, educação, empregabilidade.

 

Corporate Education and the worker employability

 

ABSTRACT

The study focused on the Corporate Education Program from an educational Institution part of the São Paulo “S System”. The study has the goal of analyzing the Corporate Education Program and its impactin increase of employability conditions of the Institution´s former employees. We approached it as a case study, using documents and bibliographic analysis and interviews with the Institution´s former employees. We oppose the idea that Corporate Education itself be able to contribute to the increase of what is called work force employability.

Key-words: corporate education, work and education, education, employability.

 

 

INTRODUÇÃO

 

O presente artigo tem como objetivo refletir acerca de achados de pesquisa que focou a educação corporativa e suas possibilidades de promover melhoria nas condições de empregabilidade dos trabalhadores.

O tema Educação Corporativa obteve espaço, primeiramente, na agenda das organizações privadas que, na busca pela atualização tecnológica permanente, ampliação de mercados e maximização de lucros, destacaram o investimento na formação profissional de seus trabalhadores como estratégia essencial para o alcance destes objetivos.

A Educação Corporativa se popularizou nos últimos 20 anos, sobretudo nos Estados Unidos, onde se estima que haja mais de 2 mil empresas com centros de “Educação Corporativa”. As pioneiras foram as empresas Motorola, Disney e GE – General Eletric, através dos seus respectivos centros de “Educação Corporativa”: Motorola University, Disney University e General Eletric Crotonville (MEISTER, 1999, p. 20-30).

Conforme Meister (1999), Educação Corporativa é um guarda-chuva estratégico para desenvolver e educar funcionários, clientes, fornecedores e comunidade, a fim de cumprir as estratégias empresariais da organização. Visa promover a disseminação da cultura da empresa para seus “colaboradores”, fornecedores, parceiros e clientes, sendo o elemento estimulador do desenvolvimento, da instalação e da consolidação das competências da organização, através do alinhamento destas às competências humanas dos trabalhadores. É, portanto, dentro do contexto da organização flexível e da gestão por competências, que surgem no âmbito das organizações os primeiros programas de Educação Corporativa.

O projeto liberal que permeou a história educacional brasileira é fruto do próprio desenvolvimento econômico, político e social, no Brasil e no mundo. Este modelo de desenvolvimento traz consigo todas as formas de organização do trabalho e de acumulação capitalista e também a idéia de que a educação do trabalhador pode aumentar, não só a produtividade da organização, mas, ao mesmo tempo, suas satisfações pessoais, como a manutenção do emprego.

Neste contexto, a educação começa a ser promovida também por organizações não-educacionais, sobretudo nos espaços onde a pessoa trabalha. Exige-se um perfil de trabalhador com competências que atendam ao modelo organizacional, tais como: flexível, disposto sempre a aprender e a “aprender a aprender”, líderes, com capacidade de comunicação e colaboração, que possuam raciocínio criativo e que possam resolver problemas, que detenham conhecimento tecnológico e de negócios, além de auto-gerenciarem suas carreiras. Segundo Meister (1999), estas competências formam a base da capacidade de empregabilidade do indivíduo.

Entendendo o conceito de empregabilidade como a capacidade da mão-de-obra se manter empregada ou encontrar um novo emprego quando demitida (LEITE, 1997, p.64), perguntamos se as ações educacionais desenvolvidas no âmbito da organização produziram uma melhor formação profissional aos trabalhadores que asseguram seu emprego.

A Instituição que buscamos examinar foi o SENAC[1] São Paulo e seu Programa de Educação Corporativa[2]. O caso estudado serviu bem para identificar as conseqüências do Programa na qualificação e na empregabilidade do trabalhador. Utilizamos os seguintes instrumentos: análise de documentos (portarias, informes e manuais disponibilizados pela organização) e das referências bibliográficas acerca do tema “Educação Corporativa”; realização de entrevistas semi-estruturadas com oito ex-funcionários da organização, que solicitaram desligamento, foram demitidos ou se aposentaram nos anos de 2006 e 2007.

Nos propusemos a compreender a Educação Corporativa como ela é apresentada no meio empresarial, isto é, como uma proposta educacional desenvolvida pelas organizações, com vistas a produzir melhorias na formação profissional de seus empregados e dependentes. Em seguida, concentramos na perspectiva social desta ação, por um lado analisando a real melhoria na formação profissional dos trabalhadores e, por outro, se isto de fato assegurou sua manutenção no emprego.

Esta iniciativa das organizações é resultado da própria evolução do processo de acumulação capitalista, que marcou tanto a organização do trabalho como a própria educação profissional. O sistema flexível se globalizou alicerçado na ideologia neoliberal, propondo a solução para o desemprego através da desregulamentação e flexibilização das relações de trabalho e emprego. Na verdade, notamos que o processo de produção flexível, ao explorar a mais-valia relativa, diminui o número de postos de trabalho e os custos inerentes à produção propriamente dita, exercida pelo trabalho vivo. Seguindo a lógica, as organizações passam a preparar o próprio trabalhador, buscando complementar ou mesmo substituir a educação formal, através da Educação Corporativa. Além disso, se estabelece uma relação “envolvente” entre empregador e empregado, colocando subjetivamente o trabalhador dependente do capital, que passa a ser responsável por sua manutenção no mundo do trabalho.

A educação brasileira ao se adequar ao desenvolvimento econômico mundial, ditado pela corrente neoliberal, transpõe-se ao campo privado, individual. Toda responsabilidade pela ascensão ou queda social do indivíduo estará condicionada à sua educação, ao seu nível de instrução e não mais às condições sociais e econômicas de onde está localizado. Gera-se um processo de individualização e competitividade, necessário para a manutenção do sistema. O Estado neoliberal pouco a pouco vai deixando de promover um direito social como a educação, para lançá-la à livre iniciativa que, por sua vez, vinculará escolaridade com empregabilidade.

A Educação Corporativa faz parte deste modelo, ao ser compreendida como estratégia de desenvolvimento e educação de funcionários, clientes, fornecedores e comunidade, sendo através deles que a organização alcançará suas metas, pois o chamado sistema de educação formal, não é entendido na ótica neoliberal, capaz de atender às demandas de mercado.

É dessa forma que diversos autores, como Drucker (1997), Régnier (1997), Meister( 1999) e Éboli (2004), além de apresentarem a Educação Corporativa como iniciativa do meio empresarial em preparar seu “capital intelectual” visando o alcance de melhores resultados e maior competitividade no mercado, também a apresentam como essencial ao próprio indivíduo, pois consideram o aprendizado contínuo, o investimento em educação e o desenvolvimento de competências necessárias para preparar o trabalhador  às oscilações do mundo do trabalho, garantindo-lhe empregabilidade.

No caso da Instituição estudada, o Núcleo de Educação Corporativa (NEC) – implantado em 2001 – estabelece seus objetivos em torno do desenvolvimento de competências nas equipes, visando a melhoria da gestão estratégica, a difusão dos valores e cultura da Instituição, aprendizagem coletiva e a qualidade de vida no trabalho. Embora não se fale que um de seus objetivos seja gerar empregabilidade, o NEC propõe aos funcionários a aprendizagem contínua, estimulando-os a dar continuidade em seus estudos e a investir em seu desenvolvimento cultural e pessoal. Ou seja: sua programação estará voltada ao desenvolvimento de competências, sobretudo aquelas oferecidas pelo mundo do trabalho e que são relacionadas ao comportamento (ética, liderança, motivação, criatividade, comunicação, etc.). Através do desenvolvimento de competências, traça-se a perspectiva da empregabilidade, do emprego para toda vida, dentro ou fora da Instituição.

O Programa de Educação Corporativa da Instituição em tela compreende cursos e ações, que são divididos em cinco categorias: Educação Formal, Educação Aberta, Cidadania Corporativa, Estratégicos e Operacionais. Dentre elas, a categoria Educação Formal, caracterizada pela concessão da Bolsa Estímulo Educacional, mostra a dependência do próprio Programa ao chamado ensino formal, para alcançar o objetivo de aumentar a escolaridade dos funcionários. Tal constatação faz refletir e ampara a afirmação de que não será possível a substituição do ensino do saber acadêmico e da pesquisa desenvolvida na universidade, por iniciativas privadas de educação de trabalhadores, pois as próprias organizações necessitam desta estrutura para desenvolver o potencial crítico de seus funcionários.

 

 

A Empregabilidade no contexto capitalista brasileiro: possibilidade e limites

 

Tratamos o conceito de empregabilidade como um termo utilizado para representar a capacidade da pessoa em se manter empregada ou encontrar um novo emprego quando demitida (LEITE,1997, p.64). O pano de fundo deste discurso é que o desemprego tem como causa a baixa empregabilidade da mão-de-obra, ou seja, a sua inadequação em face às exigências do mercado.  Segundo a autora, trata-se de um conceito equivocado, pois parte do princípio de que a massa de desempregados existente hoje, ocorre da falta de qualificação aos postos de trabalho existentes, muito por conta das novas tecnologias e conceitos de produção empregados.

Concordamos com Leite, pois este conceito ignora o fato de haver desequilíbrio entre a oferta de postos de trabalho e a própria dimensão da população economicamente ativa (PEA), observado através das transformações ocorridas ao longo do próprio desenvolvimento capitalista. A Tabela a seguir mostra, mais detidamente, o desequilíbrio entre a oferta de mão-de-obra qualificada e a demanda por empregos formais no Brasil, em 2007 – onde o saldo entre a oferta e a demanda representa a quantidade de desempregados:

 

Tabela 1. Brasil e Regiões: Saldo entre a oferta de mão-de-obra e demanda de empregos qualificados e com experiência profissional em 2007

Região

Oferta de mão-de-obra qualificada

Demanda de empregos formais

Saldo entre oferta e demanda

Norte

69.940

99.031

-29.091

Sul

227.817

254.152

-26.335

Centro-oeste

110.611

124.058

-13.447

Sudeste

886.788

868.920

17.868

Nordeste

380.912

245.886

135.026

Brasil

1.676.068

1.592.047

84.021

Fonte: IPEA

Ou seja, o contingente de trabalhadores qualificados e com experiência profissional que não encontraram oportunidades de trabalho no ano de 2007, foi de pouco mais de 84 mil trabalhadores. Este desemprego é o resultado das transformações no processo produtivo, e que encontra no modelo japonês, no toyotismo, aquele que tem causado maior impacto, na ordem mundializada e globalizada do capital (ANTUNES, 2006, p. 40 – 41).

No entanto, o conceito de empregabilidade está ligado à proposta de Educação Corporativa levantada por Meister (1999):

As qualificações e conhecimentos adquiridos promovem a capacidade contínua de emprego do funcionário – a capacidade de encontrar um trabalho significativo dentro ou fora da empresa. Em outras palavras, os empregadores estão dando aos empregados a oportunidade de desenvolver uma melhor capacidade de emprego em troca de maior produtividade e algum nível de comprometimento com a missão da empresa, enquanto lá estiverem. (p.10).

 

O termo empregabilidade fundamenta-se aqui na “valorização” dos indivíduos, pois serão maiores as oportunidades de trabalho quanto maiores forem suas condições educacionais, de preferência ao longo de toda a vida. A educação por si só, passa a ser vista como a salvação para todas as mazelas do mundo globalizado.

Já mostramos, no entanto, que o descompasso entre PEA e postos de trabalho já contradiz a idéia. Mas Fidalgo, Oliveira e Fidalgo (2007) vão além:

Educação continuada, formação em serviço, sociedade do conhecimento, organizações qualificantes, empregabilidade, competências, dentre outras, são expressões que revelam uma contextualidade imbricada em determinismos sociais, que, não raras vezes, se apresentam revestidas de um forte poder simbólico de convencimento que envolve o discurso da educação como instrumento ou meio assegurador de inserção profissional, de aumento da renda, enfim, de inclusão social. (p.18-19).

 

Percebe-se que o conceito joga para o trabalhador toda a responsabilidade pelo seu (des) emprego, gerando um processo de individualização e competitividade (GENTILI, 1998). Ao contrário de buscar valorizar o trabalhador, dotando-o de competências flexíveis que o habilite a lutar nos diversos mercados laborais pelos poucos empregos disponíveis, o processo de individualização, manutenção do emprego e responsabilização por sua competitividade no mundo do trabalho chega a acarretar problemas de saúde ao trabalhador, sobretudo no aspecto emocional.

A maioria dos entrevistados – independentemente do cargo – solicitou desligamento em virtude das próprias oportunidades que visualizaram e apareceram fora da Instituição. No caso do grupo “Docência”, a saída não se deu por falta de oportunidades, mas sim, devido ao acúmulo de funções: o perfil de docentes é composto por profissionais que exercem uma atividade específica, para funções nas quais são devidamente habilitados e também atuam na educação profissional, pois esta requer docentes que trabalhem nas suas áreas, proporcionando a conjunção do trabalho com a educação. Este acúmulo de funções também justifica a pouca participação deste grupo no Programa, de maneira geral.

Demais entrevistados saíram da Instituição, demitidos e, em um caso, por aposentadoria. Isto mostra que, apesar de todo o investimento realizado na educação destes funcionários (por qualquer que seja a categoria do curso), ela não foi suficiente para mantê-lo empregado pela organização. Portanto, a formação não é o único fator responsável pela manutenção do emprego na Instituição, pois outras variáveis interferiram para as demissões, tais como: redução do quadro de funcionários, procedimentos entendidos pela Instituição como inadequados, incompatibilidade de horários, etc.

Quanto ao tempo para recolocação no trabalho, percebemos que há uma relação direta entre escolaridade, função exercida e experiência no trabalho, com o tempo de recolocação. Desta forma, quanto maior for a escolaridade e a experiência no emprego que se procura, somada à demanda pelo trabalho que o funcionário está habilitado, menor será o tempo de busca por um emprego. Isto significa mais empregos para quem se especializa, pois é de interesse dos empregadores oferecer emprego à este contingente, reduzindo assim custos com a formação e preparo da mão-de-obra como também obtendo acesso a um trabalho mais efetivo, pois mais especializado.

Em suma, a Educação Corporativa traz benefícios não só à organização que a mantém, mas extrapola seus muros, pois mesmo que a empresa que contribuiu para a especialização do trabalhador não usufrua dos resultados do investimento uma outra o fará. Neste processo acaba por haver uma involuntária colaboração que se apresenta como importante à reprodução do sistema capitalista que tem suas exigências atuais de mão-de-obra atendidas.

Da mesma forma, o indivíduo se beneficia, pois amplia sua qualificação e, consequentemente suas possibilidades, mesmo que teóricas, de manter-se no raio de interesse dos agentes empresariais componentes do atual sistema capitalista. Porém, quando não aproveitado pela empresa responsável por sua inclusão na Educação Corporativa caberá ao indivíduo a responsabilidade pelo gerenciamento de sua carreira e auto-apresentação, de acordo com as necessidades do mercado, para melhores possibilidades de emprego: deverá se colocar à disposição do mercado.

Há também um outro importante componente, que diz respeito à agilidade na recolocação destes trabalhadores no trabalho, que são as formas pelo qual os trabalhadores buscam emprego. Os funcionários que solicitaram demissão enviaram antecipadamente seus currículos a uma rede de organizações e pessoas já conhecidas, buscando novas oportunidades. Saíram da Instituição já com a proposta de trabalho definida.

Já os funcionários demitidos são os que mais tempo permaneceram desempregados e que utilizaram na procura de um novo emprego, agências de recolocação profissional, entrega de currículos via correio eletrônico ou pessoalmente ou, no grupo “Gerência” particularmente, de serviços de outplacement[3].

Dentre as dificuldades apresentadas para a recolocação no trabalho, excetuando os ex-funcionários que tiveram recolocação imediata, destacam-se:

- especificidade de algumas funções, que possuem demanda restrita de trabalho, especialmente as de gerência;

- propostas de trabalho desvalorizadas (remuneração e função) ou sub-trabalho, em particular observadas pelos ex-funcionários classificados no grupo “Agentes Administrativos”;

- escolaridade baixa.

Por outro lado, destacamos os facilitadores para recolocação no trabalho, expressos nos depoimentos dos sujeitos entrevistados e que, evidentemente, possuem certa relação com as dificuldades apresentadas:

- experiência profissional na função desejada;

- existência de vagas e demanda de profissionais para a função;

- perfil profissional em concordância às regras de mercado;

- escolaridade alta e capacitação constante;

- a própria Educação Corporativa.

Portanto, notamos que a Educação Corporativa foi avaliada como um dos componentes importantes para a recolocação no trabalho, assim como a necessidade de escolarização elevada e formação contínua, principalmente quando nos referimos aos benefícios da categoria “Educação Formal”.

Esta avaliação por parte dos ex-funcionários da instituição revela a importância da qualificação profissional através da Educação Corporativa e condiz com os números apresentados pelo IPEA, através do estudo sobre a Demanda e Perfil dos Trabalhadores Formais no Brasil em 2007, onde apenas 18,3% do total de pessoas que procuram por trabalho no Brasil apresentam condições adequadas para imediatamente atender ao perfil dos empregos atualmente abertos no país.

Ao realizar o levantamento da situação atual de trabalho dos ex-funcionários da organização que foram entrevistados, percebemos a recolocação se deu nas mesmas funções exercidas na Instituição ou em funções onde sua experiência profissional adquirida anteriormente ainda se destaca. Isto representa o papel importante que a experiência profissional possui na obtenção de um novo emprego, que é independente de Educação Corporativa.

Os resultados da pesquisa mostram também que o setor industrial absorveu os ex-funcionários da instituição do grupo “Agentes Administrativos”, justamente os que demonstram ter menores taxas de escolaridade formal, mas que, porém, possuem qualificação profissional na função. É que o setor industrial foi o que mais careceu de mão-de-obra qualificada em 2007[4] e muito provavelmente, estes ex-funcionários tenham se beneficiado com isso, ocupando funções administrativas. Neste aspecto, a participação no Programa de Educação Corporativa pode ser considerada como diferencial.

Os demais grupos foram recolocados no setor de serviços, que é o setor, no país, que gera maior número de empregos formais para trabalhadores qualificados e com experiência profissional, conforme a figura:

Brasil: estimativas da geração de empregos formais que demandam trabalhadores qualificados e com experiência profissional em 2007

Fonte: IPEA

 

No entanto, apesar de ser o setor que mais gera empregos no país (em 2007), o setor de serviços conta com uma oferta de mão-de-obra qualificada e com experiência profissional superior ao número de vagas criadas, de pouco mais de 55 mil pessoas, no país (IPEA, 2008, p.5), o que aumenta a concorrência. Podemos inferir que o movimento de ex-funcionários do grupo “Agentes Administrativos” seja em direção à indústria pela carência e baixa concorrência que enfrentariam neste setor, ao passo que os ex-funcionários dos demais grupos – de maior escolaridade e experiência profissional, permanecem no setor de serviços, mantendo inclusive sua ocupação[5].

Percebemos que a Programação da Educação Corporativa, além de constituir mecanismo de consolidação da cultura e da política Institucional, de colaborar para o atingimento das suas metas, também contribui para a recolocação dos ex-funcionários no mundo do trabalho, além de auxiliá-los no dia-a-dia do trabalho atual.

No entanto, isto ocorre de maneira distinta: primeiro ao elevar a escolaridade formal para aqueles que são beneficiados pela Bolsa Estímulo Educacional e que puderam se manter empregados no setor de serviços, muitas vezes até em condições profissionais e pessoais consideradas por eles como melhores. Para os grupos “Docência”, “Técnicos” e “Gerência”, os cursos das categorias Educação Aberta, Cidadania Corporativa e Operacionais não possuem grande impacto na recolocação no trabalho, em virtude da rapidez dos programas e dos assuntos abordados, que, segundo os entrevistados, são pertinentes a funções específicas do trabalho na Instituição, com pouca chance de aproveitamento em outra organização. Porém, os grupos “Técnicos” e “Gerência” dão destaque à programação desenvolvida na categoria “Estratégicos”, pois, segundo eles, são cursos que desenvolvem habilidades gerenciais e de comunicação que poderão ser utilizadas e levadas pelos funcionários pelo resto da vida, inclusive aplicando essas habilidades em outras organizações.

Segundo, ao fomentar a aprendizagem contínua de funcionários que não foram beneficiados com a Bolsa Estímulo, mas participaram de outros cursos das demais categorias do Programa de Educação Corporativa. Tais cursos foram considerados importantes do ponto de vista de recolocação profissional pelo grupo “Agentes Administrativos”. Dão destaque à quantidade de cursos que freqüentaram e pelo fato de terem enriquecido o currículo com esses programas, mostrando um perfil de trabalhador pró-ativo no seu desenvolvimento educacional e, portanto, adequado às necessidades das organizações estruturadas segundo o modelo flexível de trabalho. Também valorizam a possibilidade que lhes foi dada pela Instituição, para fazer estes cursos, pois caso contrário, não teriam condições de pagar por eles, o que denota uma outra característica da Educação Corporativa: funcionar como salário indireto.

Percebemos que o investimento em Bolsa Estímulo Educacional, que efetivamente amplia a escolaridade formal dos funcionários da Instituição, retrata um aumento de escolaridade no conjunto dos funcionários, conforme aponta o gráfico a seguir, num comparativo entre 2002 e 2008:

 

Grau de Escolaridade dos Funcionários da Instituição.

Fonte: Relatório de Atividades 2002 e Relatório: Escolaridade dos Funcionários  (Gerência de Pessoal).

 

A figura aponta a redução, em seis anos, do número de funcionários que possuíam ensino fundamental e ensino médio e o aumento, no mesmo período, do número de graduados em nível superior e de pós-graduados lato-sensu (especialização). O número de mestres e doutores na instituição não sofreu alteração significativa.

No entanto, precisamos levar em consideração o que foi já apontado pela pesquisa e está demonstrada na Tabela 2, onde vemos que os ex-funcionários classificados como “Agentes Administrativos” não foram beneficiados pela Política de Concessão de Bolsa Estímulo Educacional – Educação Formal. Dessa forma, cruzando os dados das entrevistas, com os relatórios da Instituição, podemos inferir que o aumento da escolaridade dos funcionários – que tem um nível hierárquico mais baixo – não se dá via Educação Corporativa. O que ocorre é uma mobilidade nesta mão-de-obra com a demissão e admissão de novos funcionários que tenham necessariamente uma escolaridade maior, respondendo a uma remuneração baseada no cargo ou função a ser ocupada (FIDALGO; OLIVEIRA; FIDALGO, 2007, p.47). No conjunto dos funcionários, vê-se assim, um aumento da escolaridade, o que é muito bem visto internamente e aos olhos externos à Instituição, mas que não está ligada diretamente à Educação Corporativa.

O conceito de empregabilidade, como vimos, possui equívocos que, necessariamente, precisam ser superados. Carrega em si grande carga ideológica que faz mascarar a amplitude do problema de geração de empregos, distribuição da renda através do trabalho e conseqüentemente, uma proposta real de inclusão social. Deste modo, o que podemos notar é que a Educação Corporativa, ao mesmo tempo que é lógica à manutenção da Instituição no mercado, demonstra colaborar também com os funcionários, para o alcance de novas  possibilidades de emprego. Ao mesmo tempo em que é importante para a Instituição, é assim também ao funcionário, sobretudo àqueles beneficiários da Bolsa Estímulo Educacional e que são considerados estratégicos à organização, para manutenção de sua identidade política e cultural. Embora não se possa afirmar o mesmo, quanto ao aumento do nível de educação formal do grupo de funcionários considerado de menor escolaridade, uma vez que não aparece como prioritário à concessão do benefício da Bolsa Estímulo, os demais cursos da Educação Corporativa são também importantes a este, uma vez que promovem a sua contínua formação. Como conseqüência, encontrará possibilidades de emprego em setores da economia (sobretudo o industrial) onde a concorrência é menor, não exista maiores exigências pela escolaridade e se privilegie a especialização.

No entanto, a Educação Corporativa encontra limites na própria economia, diante do descompasso entre oferta e demanda por mão-de-obra e das propostas de livre-mercado. Neste sentido, de nada adianta qualquer esforço educacional se as possibilidades de emprego se encontram reduzidas, dado o crescente mecanismo encontrado pelo capital em reduzir o trabalho vivo.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Notamos que cada uma das cinco categorias que compõe a programação da Educação Corporativa do SENAC São Paulo influenciam diferenciadamente a empregabilidade dos funcionários.

Percebemos que ao conceder o benefício da Bolsa Estímulo, o funcionário aumenta suas condições de se manter empregado, em alguns casos, conseguindo oportunidades em outras organizações, em virtude da sua formação. Nesse sentido, a Educação Corporativa, através da Bolsa Estímulo Educacional, aumenta a escolaridade e promove ganhos tanto para a organização, quanto para o funcionário.

As demais categorias do Programa de Educação Corporativa, apesar de não representar aumento no nível de escolaridade dos funcionários, promovem a formação continuada no grupo de menor escolaridade e por conseqüência, as oportunidades de emprego surgem em outros setores da economia, onde a procura é por trabalhadores especializados, que participaram dos cursos contidos nas demais categorias do Programa, além da experiência profissional adquirida. Programação esta que está voltada mais para o desenvolvimento, no funcionário, de conhecimentos e habilidades requeridas pela organização em seu trabalho diário e imediato e que, por sua vez, ganha com isso. No entanto, o grupo permanece com escolaridade mais baixa, que implicará maiores dificuldades para o acesso ao emprego, principalmente se a procura se der no setor de serviços.

Assim, a programação liga-se à missão e objetivos da Instituição, mas se estabelece nos funcionários provocando certa dualidade. A Educação Corporativa ao promover o processo de transmissão da herança cultural da organização, visando perpetuar sua existência, incumbe seus quadros estratégicos nesta tarefa. Sendo assim, os contemplados com a Bolsa Estímulo Educacional, para cursos de nível superior (graduação e pós-graduação) são, em sua maioria, funcionários que possuem cargos mais elevados e maior tempo de serviço à Instituição. De outra maneira, os funcionários dos grupos “Agentes Administrativos” freqüentam mais os cursos contidos nas demais categorias, sobretudo os cursos “Operacionais” e “Educação Aberta”.  O grupo “Docência” participa mais efetivamente do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), considerado como “Estratégico”.

Percebemos esta questão e nos propomos a contribuir com a organização a alterar este quadro, para que cada vez mais os quadros de menor escolaridade possam ter acesso ao benefício que realmente ajuda a promover condições melhores de emprego, numa possível situação de desligamento. Assim, a Bolsa Estímulo Educacional alcançará a proposta de aumentar a escolaridade no conjunto dos funcionários da Instituição, rompendo com o dualismo e chamando os trabalhadores para construírem conscientemente a própria organização, novas possibilidades de trabalho e projetos alternativos de vida.

Neste sentido, discordamos das afirmações que se referem ao desemprego como conseqüência da má ou baixa escolaridade da população. Notamos que o desemprego é um fenômeno resultante da falta de geração de empregos pela economia e a Educação Corporativa possui limites para dar conta deste problema.

A ideologia neoliberal “empurra” para o indivíduo a responsabilidade por sua escolarização, sob a promessa da empregabilidade, com a finalidade de ter sempre à disposição uma qualificada reserva de trabalhadores, dependente da classe detentora dos meios de produção e necessária para a reprodução do sistema capitalista.

Dessa forma, a educação não pode ser responsabilizada pela limitada oferta do mercado. Percebemos através do caso estudado, que a Educação Corporativa não foi suficiente, por si só, para manter o funcionário na organização – um de seus objetivos citados na literatura, especialmente por Meister (1999) e Éboli (2004). Por um lado, os funcionários que foram beneficiados pela Educação Corporativa utilizaram o benefício para a busca de outras oportunidades de trabalho. Isto é: a educação tem características próprias, que permitem ao indivíduo fazer uso de seus resultados ao longo da vida, agindo conforme seus interesses.

Por outro lado, estes mesmos funcionários podem ter seu contrato de trabalho rompido unilateralmente, por parte do empregador e, dessa forma, a Educação Corporativa vê limitações para a promover a manutenção do emprego.

Sugerimos à organização, a fim de evitar que o investimento na educação desses funcionários não tenha retorno, que se pense em alternativas nas quais o funcionário se comprometa a aplicar os conhecimentos adquiridos no dia-a-dia de trabalho, como por exemplo, estipulando um determinado tempo mínimo entre a formação e a sua saída para um novo emprego.

A alta escolaridade pode ser vista como um dos facilitadores para obtenção de um novo emprego, porém isso deverá ser conjugado à construção de uma experiência profissional sólida e ao surgimento de novas possibilidades de trabalho, que podem ser resultado de uma política agressiva do Estado na geração de empregos e de aquecimento da economia. Abre-se com isso a perspectiva de redução da economia informal, a partir do momento que parte da PEA passe a ser preparada profissionalmente às necessidades do mundo do trabalho e obtenha finalmente um emprego formal.

Por fim, acreditamos que a Educação Corporativa, contribuindo com a própria organização, para o melhor preparo profissional do trabalhador estará também se descaracterizando como ação exclusivamente pragmática, determinada em tempo e lugar, passando a contribuir indiretamente com o país, aumentando sua produtividade e propiciando, através do aumento da escolaridade de parte da população, melhores alternativas e possibilidades para desenvolver o trabalho.

No entanto,  o desafio da inclusão social e do direito à educação, mesmo através de uma proposta de Educação Corporativa progressista, necessariamente passará pela garantia por parte do Estado dos direitos sociais previstos pela Constituição, de uma educação pública e gratuita de qualidade e de condições de trabalho formal avessas à exploração do trabalhador.

 

REFERÊNCIAS

 

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______. Política de Concessão de Bolsa Estímulo Educacional – Educação Formal. São Paulo, 2008 (Versão 4).

 

______. Relatório Anual de Atividades 2002. São Paulo: Gerência de Comunicação, 2003.

 

______. Relatório Anual de Atividades 2006. São Paulo: Gerência de Comunicação e Relações Institucionais, 2007.

 

______. Proposta Pedagógica. São Paulo, 2005.

 

 


[1] É uma instituição educacional privada, sem fins lucrativos, criada pelos Decretos-lei 8.621 e 8.622, de 10 de janeiro de 1946, através do qual o Governo Federal autorizou a Confederação Nacional do Comércio a instalar e administrar, em todo o território nacional, escolas de aprendizagem comercial.

 

[2] A Instituição introduziu o conceito de Educação Corporativa em fins da década de 1990 e definiu como estratégico um Projeto de Educação Corporativa que pretendia organizar a infra-estrutura educacional disponível para promover a aprendizagem organizacional e a gestão do conhecimento a partir do desenvolvimento das competências essenciais para a gestão estratégica dos negócios da Instituição. Assim, em 2001, foi criado o Núcleo de Educação Corporativa – NEC – ligado à Gerência de Pessoal, indo ao encontro da macro-estratégia da organização: desenvolver pessoas, como diferencial competitivo. (SENAC, 2001).

 

[3] Outplacement é uma atividade que tem como objetivo, estudar junto com o profissional a solução para sua carreira, levando em conta o que o mercado oferece, a experiência e o objetivo da pessoa. Faz parte do trabalho prestar ajuda no preparo do currículo, ensinar a fazer rede de relacionamentos, analisar o comportamento do executivo, fornecer informações sobre consultorias e processos de seleção, indicá-lo para vagas de Consultorias ou empresas parceiras, provendo um trabalho fim-a-fim na transição de carreira do profissional. Quem paga este trabalho é a empresa que está desligando o profissional ou, em alguns casos, a empresa contratante. O profissional-candidato nada paga por isso.

 

[4] Segundo o IPEA, um déficit estimado em 117 mil pessoas, equivalente a 26,2% dos empregos anualmente criados neste setor.

[5] Principalmente na região Sudeste onde o subsetor de serviços de educação, saúde, assistência social, lazer e serviços pessoais e domésticos, encontra dificuldades para suprir a carência de 23,5 mil trabalhadores, ao contrário do restante do país, onde a oferta é maior que a demanda. (IPEA, 2008, p.11)

 

Autor deste artigo: Rodrigo Buzin Siqueira do Amaral - participante desde Ter, 07 de Fevereiro de 2012.

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