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Colunas Edgar Gastón Jacobs Flores Filho O núcleo docente estruturante pode ser exigido das IES?
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Escrito por Edgar Gastón Jacobs Flores Filho   
Qua, 08 de Julho de 2009 11:37

Prof. Dr. Edgar Gastón Jacobs Flores Filho

Prof. Dr. Júlio Aguiar de Oliveira

 

 

 

Um dos novos temas relativos à avaliação de cursos é a exigência do Núcleo Docente Estruturante (NDE). O NDE de um curso é um grupo de professores altamente qualificados e engajados na construção dos projetos pedagógicos.

 

Trata-se de uma exigência aparentemente pertinente e, em princípio, vantajosa para as IES. Afinal, a representação do corpo docente nas reuniões com as comissões de avaliação passaria a ser da responsabilidade exclusiva do NDE, dispensando a presença dos demais professores. Além disso, o grupo poderia ficar responsável por criar e difundir a “cultura institucional” e as diretrizes do projeto pedagógico, assumindo o compromisso pela constante evolução das condições de ensino.

 

 

No entanto, não há lei que fundamente a exigência do NDE e, na ausência de previsão legal, essa nova estrutura não pode ser usada para impor restrições às IES.

O presente artigo explora essa questão e oferece as bases para duas discussões ainda maiores. A primeira, sobre os limites do Poder Regulamentar na área de educação e, a segunda, sobre a relação entre regulação a avaliação da educação superior.

 

1 O núcleo docente estruturante como requisito para os atos regulatórios do MEC

 

O Núcleo Docente Estruturante (NDE) surgiu no momento de transição entre o Decreto nº 3.860/2001 e o Decreto nº 5.773/2006. Ele constou da Portaria nº 147/2007 que, por sua vez, foi o resultado de relatórios elaborados por grupos de trabalho na área de Direito e Medicina.

Nesse contexto, o NDE foi previsto na portaria de 2007 como um elemento específico de avaliação que deveria “complementar a instrução” dos processos de autorização de cursos de graduação em Direito e em Medicina que tramitavam perante o Ministério da Educação, mas ainda não tinham sido concluídos em virtude de parecer contrário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e da ausência de parecer favorável do Conselho Nacional de Saúde. Era, portanto, uma exigência extra para subsidiar a decisão administrativa do MEC em relação àqueles processos específicos.

Naquele momento, a norma regulatória determinava aos cursos sem avaliação favorável da OAB ou do CNE que apresentassem “elementos específicos de avaliação” capazes de indicar a existência de um “núcleo docente estruturante, responsável pela formulação do projeto pedagógico do curso, sua implementação e desenvolvimento” (art. 2º e 3º, da Portaria nº 147/2007). Esse núcleo deveria ser composto por professores com as seguintes características: a) titulação em nível de pós-graduação stricto sensu; b) contratos em regime de trabalho que assegurem, preferencialmente, dedicação plena ao curso e c) experiência docente.

Depois desse momento inicial, o Núcleo Docente Estruturante passou a constar dos instrumentos de avaliação e consolidou-se como uma exigência para todos os cursos e todos os atos regulatórios a eles pertinentes. Mantendo as mesmas características originárias, o NDE passou a constar das portarias ministeriais que aprovavam os instrumentos de avaliação de cursos e passou a ser detalhado pelo INEP nesses documentos.

Com base nesses novos instrumentos, as comissões de avaliação do INEP têm exigido um núcleo institucionalizado de docentes caracterizado como uma estrutura administrativo-pedagógica criada a partir de regras internas das IES. Esse núcleo docente teria de ser um grupo de professores com as qualidades especificadas nos documentos de avaliação e teria, também, tarefas e competências delineadas pelo mesmo documento de avaliação. Enfim, uma estrutura imposta com conteúdo e forma às Instituições de Ensino Superior.

Para ilustrar essa intervenção, pode-se destacar que as IES que pleiteiam a autorização de novos cursos de medicina recebem notas satisfatórias - “3” - em relação ao NDE, quando:

 

[...] o NDE é composto pelo coordenador do curso e por, pelo menos, 30% dos docentes previstos para os três primeiros anos, com contrato de trabalho já firmado com a IES, participação suficiente na elaboração do Projeto Pedagógico do Curso e clara responsabilidade com a implantação do mesmo.

[...] 100% do NDE possui titulação acadêmica obtida em programas de pós-graduação stricto sensu devidamente reconhecidos pela Capes/MEC ou revalidada por instituição credenciada, e, destes, entre 50% (inclusive) e 60% (exclusive) são doutores.

[..] entre 60% (inclusive) e 70% (exclusive) do NDE possui graduação em medicina.

 

Para os cursos de direito as exigências são similares, reduzindo-se apenas o prazo do primeiro item de 3 para 2 anos.

Os demais bacharelados e as licenciaturas possuem regras equivalentes, mas com as seguintes alterações: 1) redução da exigência de titulação para 60% e 2) exigência de que 100% dos membros do NDE tenham regime parcial ou integral, sendo, no mínimo, 25% em dedicação integral.

Finalmente, ainda com relação às autorizações, cabe observar que para os cursos superiores de tecnologia há exigência de NDE composto 30% dos professores do primeiro ano, com todas as regras demais cursos e especial atenção para o fato de que “apenas” 60% dos integrantes do NDE tem de ter curso de pós-graduação stricto sensu. Todavia, para destacar a importância da prática nos cursos de tecnologia, o documento de avaliação exige que “30% (inclusive) e 50% (exclusive) do NDE” possuam experiência profissional fora do magistério.

Para o reconhecimento dos cursos as regras são muito próximas, destacando-se apenas a exigência de que o NDE seja “composto por 30% do corpo docente”. Este requisito, ainda pendente no caso da Medicina, já consta do glossário do instrumento de avaliação dos cursos de Direito, de outros bacharelados e das licenciaturas. Na prática, exige-se um aumento da titulação e dos encargos com regime de trabalho de vários docentes e torna o “núcleo” uma estrutura ampla e bastante onerosa.

Para a renovação de reconhecimento fica mantido o percentual mínimo de 30% e surge a imposição de que os docentes do NDE atuem “ininterruptamente no curso desde o último ato regulatório”. Além disso, a previsão de um percentual mínimo de doutores no NDE - 50% - também é acrescentada para todos os cursos de licenciatura, tecnologia e bacharelado.

Portanto, o Núcleo Docente Estruturante é um conjunto de professores com elevada titulação e regime de trabalho ampliado, cuja responsabilidade é a formulação, implementação e desenvolvimento do projeto pedagógico. E, hoje, tem sua forma detalhada nos instrumentos de avaliação do INEP.

 

2 A questão da legalidade da exigência do NDE

 

Os instrumentos de avaliação de cursos do INEP, que formatam - ou, num linguajar jurídico, “regulam” - o NDE, não são leis. São apenas documentos administrativos construídos a partir de um “extrato” aprovado em portarias ministeriais.

Entretanto, segundo a Portaria Ministerial nº 1.027/2006, que regula o banco de avaliadores (BASis) do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES e a Comissão Técnica de Acompanhamento da Avaliação – CTAA: O funcionamento do BASis obedecerá aos seguintes princípios: I – legalidade (art. 2º, § 1º).

Esse princípio, que vincula a conduta de todas as comissões de avaliação in loco no SINAES, tem por fundamento os princípios aplicáveis aos servidores públicos (art. 37, da CR) e o princípio constitucional basilar que dispõe: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5º, II, da CR).

A expressões “lei” e “legalidade”, nesse contexto, não se referem aos atos normativos do Poder Executivo (como, por exemplo, as portarias ministeriais). “Lei” é o resultado de um processo constitucionalmente previsto, conduzido pelo Poder Legislativo. E “legalidade” é o cumprimento das normas legais assim produzidas, bem como das normas regulatórias a elas estritamente e limitadamente vinculadas.

No âmbito teórico, o princípio da legalidade pode ser entendido como [...] a consagração da idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.[1] Ou seja, trata-se de uma estrita vinculação da atuação dos órgãos da Administração Pública - ou de entes que a representem, como as comissões de avaliação do INEP – aos termos e limites da lei. Isso ocorre porque há de se pressupor que a lei é produzida democraticamente e seria incoerente possibilitar aos administradores públicos agir em desconformidade com a lei.

Nesse rumo, tratando o princípio da legalidade como o “princípio dos princípios”, Maria Paula Dallari Bucci afirma que:

 

O Estado de Direito representa o triunfo do Direito e da concepção liberal que nos legou o constitucionalismo, na medida em que assegura não apenas a sujeição dos cidadãos à lei, mas principalmente a sujeição das autoridades e dos governantes a essa mesma lei. E a lei – frise-se –, ainda como fruto do Liberalismo, entendida como regra de Direito, geral e abstrata, emanada do povo ou de seus representantes (Jacques Chevallier, L’État de Droit).

Isso tem como conseqüência as restrições ao exercício de poderes normativos pela autoridade administrativa, a qual deve estar sempre fundamentada em uma prescrição legal ou em uma regra de habilitação jurídica, contida na norma de competência (Charles Eisenmann, “O princípio da legalidade”, artigo publicado na RDA 56)[2].

 

No caso em análise não há “prescrição legal” que fundamente a exigência do NDE e a competência para organização dos docentes, nos termos da LDB, é da Instituições de Ensino superior, ou seja, inexiste, também, uma “regra de habilitação jurídica” que permita aos agentes reguladores impor uma forma de organização dos docentes nas IES.

O NDE foi criado num momento de transição. Sua criação deu-se, especialmente, para que houvesse um subsídio complementar para as decisões administrativas em relação aos processos daqueles cursos para os quais faltava parecer favorável da OAB ou do CNS. Porém, sua transposição para todos demais atos regulatórios do Ministério da Educação aparentemente não respeitou o princípio da legalidade.

Em primeiro, lugar por um fato muito simples: não há lei que exija a existência do Núcleo Docente Estruturante como requisito para a atividade econômica ligada ao ensino superior. Em segundo lugar, porque a competência legal para estruturar os recursos humanos, bem como toda a rotina em relação ao projeto pedagógico, é das instituições de ensino superior e não do órgão regulador.

 

2.1 Sobre o excesso de poder regulamentar

 

Para vincularem-se ao sistema federal as Instituições Ensino têm de cumprir exigências previstas em lei.

Isso decorre da aplicação do art. 170, parágrafo único e do art. 209, da Constituição da República, que prevêem:

 

Art. 170 [...] Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

[...]

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público. (grifamos)

 

Ao contrário da avaliação, a regulação do ensino superior não possui lei específica. Há somente um enunciado genérico na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que exige: A autorização e o reconhecimento de cursos, bem como o credenciamento de instituições de educação superior, terão prazos limitados, sendo renovados, periodicamente, após processo regular de avaliação (art. 46, da Lei 9.394/96)

Mas, apesar da evidente omissão legislativa – ou da limitada abordagem, se considerada a referência na LDB – o Poder Público vem tratando da regulação do ensino superior, já há muitos anos, por meio de decretos. Exemplo disso é o Decreto nº 5.773/2006, que, sem se preocupar com a limitação dos requisitos legais, dispõe que:

 

Art. 35. A instituição deverá protocolar pedido de reconhecimento de curso, no período entre metade do prazo previsto para a integralização de sua carga horária e setenta e cinco por cento desse prazo.

§ 1o O pedido de reconhecimento deverá ser instruído com os seguintes documentos:

I - comprovante de recolhimento da taxa de avaliação in loco;

II - projeto pedagógico do curso, incluindo número de alunos, turnos e demais elementos acadêmicos pertinentes;

III - relação de docentes, constante do cadastro nacional de docentes; e

IV - comprovante de disponibilidade do imóvel.

[...]

Art. 41. [...] § 1o O pedido de renovação de reconhecimento deverá ser instruído com os documentos referidos no art. 35, § 1o, com a atualização dos documentos apresentados por ocasião do pedido de reconhecimento de curso.

§ 2o Aplicam-se à renovação do reconhecimento de cursos as disposições pertinentes ao processo de reconhecimento.

 

Certamente nenhuma dessas exigências consta do texto da LDB. E, por isso, já nesse nível de regulação, existem discussões judiciais sobre o excesso de poder regulamentar, ou seja, sobre o desrespeito aos limites do texto contido na lei regulamentada pelo decreto.

É um fruto dessas discussões judiciais o fato de que o Judiciário já consolidou jurisprudência no sentido de que o Decreto de 2006 e seu antecessor de 2001, sob fundamento regulamentarem a LDB, exorbitaram o poder regulamentar ao exigir a comprovação de regularidade fiscal. Nesse sentido:

 

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. REQUERIMENTO DE RECONHECIMENTO E RENOVAÇÃO DE RECONHECIMENTO DE CURSO FORMULADO SOB A ÉGIDE DO DECRETO Nº. 3.860/2001. RECEBIMENTO E PROCESSAMENTO CONDICIONADOS À COMPROVAÇÃO DE REGULARIDADE FISCAL E PREVIDENCIÁRIA. ILEGALIDADE. I - Afigura-se abusiva e ilegal a exigência de comprovação de regularidade fiscal e previdenciária, para recebimento e processamento de pedido de reconhecimento e de renovação de reconhecimento de curso superior, instituída mediante decreto, uma vez que extrapola os limites do seu poder regulamentar, a imposição de exigências não prevista em lei, mormente quando utilizadas como modalidade de coação para o recebimento de tributos. Os eventuais débitos da instituição de ensino para com o Fisco devem ser cobrados por meios próprios, observando-se o devido processo legal. II - Apelação e remessa oficial desprovidas. Sentença confirmada. (TRF 1ª Região. AC - APELAÇÃO CIVEL – 20063400010967. Processo: 200634000109677 UF: DF Órgão Julgador: SEXTA TURMA. Fonte: e-DJF1 DATA:16/03/2009 PAGINA:216, grifo nosso)

 

Por certo, deve ser considerado o fato de que a exigência de regularidade fiscal é bem menos pertinente à atividade de ensino do que uma exigência sobre a organização acadêmica, como é o caso em relação ao NDE. Mas, por outro lado, o fato de se tratar de portaria, espécie normativa inferior aos decretos, que foram contestados com sucesso em juízo, torna ainda mais flagrante a ilegalidade.

O que pretende o órgão regulador no caso do NDE é coagir as instituições a criarem núcleos com características que vão muito além das exigências legais. Como exemplo, basta dizer que existe um número mínimo de doutores nas áreas de Direito que não é sequer exigido para centro universitário ou universidade na Lei de Diretrizes e Bases. Dessa forma, se as portarias que aprovam os instrumentos de avaliação extrapolam “os limites do seu poder regulamentar” ao impor “exigências não prevista em lei”, perdem sua validade.

Enfim, a exigência de constituição de um Núcleo de Docentes – por meio de instrumentos de avaliação – é requisito que não está previsto em lei e, por isso, há, na exigência desse requisito para a autorização, o reconhecimento ou a renovação de reconhecimento de um curso superior, um desrespeito ao princípio da legalidade.


2.2 Sobre a usurpação de competência e autoregulação da IES

 

A Lei de Diretrizes e Bases expressamente prevê “incumbências” para as IES em relação a sua proposta pedagógica e à administração de seu pessoal e de seus recursos materiais e financeiros (art. 12). Nesse sentido, as IES são parte do sistema federal de ensino com competência especificada na lei que regulamenta o setor.

Ora, se as instituições possuem a competência e a tarefa de elaborar suas propostas pedagógicas e de administrar seu pessoal, a Administração Pública, seja por meio de decreto ou, como de fato acontece, por meio de “instrumento de avaliação”, não pode impor uma organização pedagógica e de pessoal docente.

Bom frisar que não se trata de um critério de qualidade, o que seria da competência do órgão regulador do ensino superior. Concretamente, não há nos instrumentos de avaliação uma nota prevista para os cursos que não possuem a estrutura do NDE institucionalizada. Assim, pode-se dizer que o NDE é um requisito criado por quem não tem competência para criar e exigir requisitos dessa natureza. A exigência de tal estrutura institucionalizada, feita pelas comissões de avaliação (com suposto fundamento nos instrumentos de avaliação), é uma forma de desvio de poder da Administração Pública. Desvio que leva necessariamente à nulidade dos atos – ou instrumentos avaliativos – e à invalidade das avaliações feitas com base neles.

O jurista Celso Antônio Bandeira de Melo destaca que em situações nas quais a Administração Pública atua sem preocupar-se com os limites de sua competência para atos específicos pode haver uma forma de desvio de poder, mesmo quando existe boa-fé. Segundo Bandeira de Melo:

 

[...] poderá suceder que a autoridade não tenha agido de má fé: isto é, poderá ocorrer que haja equivocadamente suposto que a competência utilizada fosse prestante, de direito, para alcançar a finalidade visada, quando, em rigor de verdade, não o era. Nada importa: quer haja incidido em erro de Direito, ao imaginar cabível o meneio da competência para um fim só objetivável por outra competência, quer haja deliberadamente se servido de uma competência imprópria, pretendendo com isto eximir se de embaraços, dificuldades ou demoras que o estorvariam ou retardariam se fora utilizada a competência pertinente haverá, do mesmo modo, incorrido em desvio de poder.[3]

Nesse caso, para deixar claro o desvio de poder no caso do NDE, é importante salientar que a Constituição da República expressamente garante a todas as instituições de ensino superior o direito à pluralidade de concepções pedagógicas (art. 206) e, especialmente para as universidades, garante a autonomia (art. 207).

A atividade de ensino é livre para a iniciativa privada e não é licito que o agente regulador queira moldá-la por meio de instrumentos de avaliação. A intervenção pública na atividade privada é pertinente e, muitas vezes, necessária, mas somente aquelas intervenções previstas em lei devem ser admitidas. O gestor público deve cumprir sua tarefa de regular a atividade econômica sem buscar gerir (ou mesmo planejar) as atividades dos agentes privados. Até porque, a sobre-determinação ou planejamento da forma de atuação dos agentes privados é irregular e inconstitucional, na medida em que fere o art. 174, da Constituição da República, que prevê: Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado (grifo nosso).

Com relação ao Núcleo Docente Estruturante, pode-se dizer que a atuação do agente regulador – MEC – impondo a criação de uma estrutura no corpo docente, atribuindo-lhe objetivos e estipulando certas qualidades de seus membros, não se apresenta como uma indicação para o planejamento das IES. Trata-se, hoje, de uma determinação expressa, de um comando às instituições de Ensino Superior sob pena de proibição de suas atividades.

Não é aceitável a idéia de que a Constituição da República e A LDB deixem um espaço para a autoregulação e o planejamento das atividades das IES privadas, para, logo depois, o Poder Executivo (MEC) por meio de um instrumento de “avaliação”, impor, como condição mínima de regularidade, uma forma determinada de estruturar o corpo docente e de acompanhar o projeto pedagógico.

Portanto, a competência das IES, prevista na LDB e na Constituição da República, também demonstra a ilegalidade da exigência do Núcleo Docente Estruturante por meio de instrumentos e portarias do Poder Executivo.


3 Conclusão

 

A participação do Estado nas funções de avaliação e regulação do ensino superior é importante e indispensável.

Por certo o “mercado” não pode regular a atividade econômica de ensino com foco em qualidade sem bons indicadores e sem uma atuação firme do Poder Público. Especificamente em relação aos cursos superiores, é preciso uma avaliação isenta e um bom controle de entrada (autorização e ou reconhecimento) e de atuação (renovação de reconhecimento) das IES. De outra forma, estratégias puramente financistas ou concepções pedagógicas com falhas graves, poderiam tornar os cursos superiores meros instrumentos de renda ou de práticas pedagógicas reprováveis.

Todavia, o princípio da legalidade e a competência das IES não podem ser mitigados.

A atuação regulatória que não parte da lei é arbitrária e indesejável. Os excessos configuram uma forma de desvio de poder, ainda quando bem intencionados. Por outro lado, é desejável um ambiente criativo e plural na área de educação. E para tanto, tem de ser preservada a liberdade das Instituições de Ensino ou, no mínimo, tem de ser valorizada a competência que lhes foi atribuída pela LDB.

A educação, nos termos da Constituição da República, pode ser resultado de uma parceria entre o Estado e a Iniciativa privada. Nunca é demais lembrar que o ensino e a educação formal nasceram da iniciativa privada e foram apropriados pelos Estados Nacionais para a criação de um discurso “oficial”, que nem sempre contribuiu para dignificar o ser humano. Mas também não se pode deixar de observar que algumas instituições privadas se tornaram mais focadas no lucro do que na qualidade de ensino.

É preciso buscar um meio termo. Talvez um bom começo seja a valorização dos limites impostos por lei às Instituições de Ensino e, é claro, ao Poder Público.

 


Prof. Dr. Edgar Gastón Jacobs Flores Filho

Bacharel em Direito pela PUC/MG – 1992. Mestrado em Direito Econômico pela UFMG – 2002. Doutorado em Direito Privado pela PUC/MG – 2008. Professor Adjunto de Direito Civil UFOP. Professor Adjunto de Direito Civil e Direito Econômico da PUC/MG. Ex-Presidente do Colegiado do Curso de Direito da UFOP/MG. Ex-Procurador do Município de Ouro Preto/MG. Advogado na Área de Direito Educacional. Chefe da Divisão Jurídica da CONSAE.

 

Prof. Júlio Aguiar de Oliveira

Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela UFMG. Professor Adjunto da Universidade Federal de Ouro Preto no Curso de direito. Professor dos Cursos de Pós-Graduação em Direito da PUCMINAS.



[1] MELLO, C. A. B. de. Curso de Direito Administrativo. 25. Ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Malheiros, 2008, p. 100.

[2] BUCCI, M. P. D. . Processo administrativo: perspectivas modernizantes decorrentes da nova legislação. In: J.E.Cardozo; J.E.Queiroz; M.W. Batista dos Santos. (Org.). Curso de Direito Administrativo Econômico. São Paulo: Malheiros, 2006, v. III, p. 835.

[3] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Jurisdicional. 2º. Ed. 9º Tiragem. São Paulo: Editora Malheiros, 1995, p. 59.

 
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