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Reflexões sobre "silêncio virtual" no contexto do grupo de discussão na aprendizagem via rede PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Maria Ilse Rodrigues Gonçalves   
Qua, 01 de Setembro de 2004 21:00

Aspecto difícil de lidar nos grupos virtuais é, sem dúvida, o 'silêncio virtual', cujas origens podem ser as mais variadas. As formações grupais podem propiciar tanto a verbalização quanto o silêncio, o que não é prerrogativa do grupo virtual, uma vez que existe também no presencial. Entretanto, no virtual, esse problema é mais complexo, pois, se a sua comunicação é pela escrita e esta não existe, resta só silêncio, não há comunicação.

A presença ou a ausência física de alguém é notada em uma classe presencial, haja ou não participação verbal. No ambiente eletrônico, o participante pode desaparecer mais facilmente, sendo sua ausência notada.

Todavia, é mais fácil ser ignorada do que uma cadeira vazia, porque, embora esta seja uma espécie de presença, significa que um aluno deveria estar no seu lugar. Essa cadeira vazia pode caracterizar uma presença, às vezes, muito eloqüente. Pode significar esquecimento, não-importância ao debate, enfim, pode implicar uma série de dados relevantes.

Também é mais fácil ser um membro quieto em um grupo face a face. Os demais sabem que ele está presente, mesmo permanecendo em silêncio, podendo ocorrer ainda o estar fisicamente presente, porém alheio, envolto em suas dificuldades emocionais. Às vezes, em um grupo presencial, pode-se claramente perceber o que o participante quer dizer com o não dizer. Outras, não. Pode ocorrer ainda, de acordo com a postura do grupo, ser mais fácil detectar qual o tipo de silêncio e o que este significa.

Em grupos eletrônicos, os participantes mais quietos simplesmente não estão presentes. Permanecem em um lugar chamado por eles de "fundão", "leitores", "observadores", "silenciosos", ou seja, estão envoltos no "silêncio virtual".
Na presencialidade, existem outras formas de expressão: comunicação do corpo, do rosto, dos olhos, da postura. Enfim, o participante pode sinalizar, gerando uma comunicação não-verbal que a completa. A personalidade do participante constitui aspecto importante. Alguns, por timidez, apresentam certas dificuldades, o que ocorre também com os nãotímidos, que atribuem mais importância à fala oral do que à escrita. Há tímidos que opinam em ambientes virtuais, já que podem refletir antes de exteriorizar suas idéias. Freqüentemente, até os extrovertidos em grupos presenciais
permanecem mais em silêncio quando participam de grupos virtuais.

É interessante que educandos participantes de grupos de discussão (GDs) virtual, em sala de aula, às vezes se expressem pouco. Seria questão da personalidade do participante identificar-se ou não com aquele espaço? No momento, vive-se uma mudança de paradigma e deve-se ter postura mais ativa. Nos GDs, há os que permanecem como alguns alunos na sala de aula presencial: não têm o que fazer. Basta deixar o professor comandar o show e pronto.

Além das situações mencionadas, o silêncio pode ainda se manifestar em situações inusitadas. Por exemplo, não concordar com algo e preferir calar-se; refletir uma forma de agressão; sentir que o outro não merece resposta; resultar de dificuldades emocionais; não atribuir importância ao debate, talvez por terem estabelecido outras prioridades.

Nos grupos de aprendizagem em rede, quando alguns integrantes não participam, os demais percebem esse silêncio e ficam incomodados. Assim, uma parte comunica-se e a outra não, e a primeira sente-se incomodada diante de não-participação da outra. O mal-estar manifesta-se claramente nos participantes, que em geral solicitam ao moderador enviar e-mail e telefonar para saber por que os demais não se manifestam.

Há uma exigência, uma demanda dos participantes ativos diante daqueles que estão no silêncio virtual.

Em certas ocasiões, a possibilidade de comunicação ou quebra no silêncio do grupo é necessária, embora possa simbolizar, em determinados momentos, algo complexo, cuja presença precisa ser estabelecida pelo professor/tutor/moderador, seja na comunicação escrita ou verbal. Paradoxal que seja, a premência em compreender o silêncio faz com que se tenha pouca tolerância em relação a ele. Diante de dificuldades quanto a essa compreensão, surgem questionamentos que não devem requerer respostas prontas e implicam pesquisar, refletir, vasculhar, em uma curiosidade a respeito do saber. É necessário que se tenha mais abertura, mais receptividade nesses
momentos. Ignorar o silêncio diante do que não está sendo comunicado... Pode-se ter uma postura sábia, produtiva, diante do silêncio, ou uma postura esterilizante, que exige resposta rápida e que pode ser reflexo da ansiedade do professor/tutor/moderador.

Refletir, imaginar, criar, inventar, integrar novas idéias são atividades intelectuais que necessitam, antes de tudo, de silêncio, no qual o pensamento é a atividade principal (Schutzenberger e Weil, 1977, p. 65). Dessa forma, em determinado momento, o participante precisa metabolizar, elaborar mentalmente o que está sendo desenvolvido. Seria mais ou menos um recolhimento, no qual reflete ou simplesmente tenta assimilar o impacto do que foi vivenciado.

Esses são os silêncios "fecundos", segundo Rudio (1993), ou os silêncios construtivos. Tais momentos não podem ser interrompidos mediante intervenção, sobretudo se ansiosa, do professor/tutor/moderador, pois refletem exatamente o participante encontrando-se consigo mesmo. Paradoxalmente, quando o profissional tem condição de respeitar esses momentos, eles podem ser acompanhados por acolhimento e reflexão. O professor/tutor/moderador não deve intervir com turbulência, com invasão, com cobrança, uma vez que se trata de momentos de profunda e significativa delicadeza humana. Assim, sua presença silenciosa e seu acolhimento tornam-se mais importantes do que qualquer intervenção, tanto verbal quanto escrita.

Todo esse desenrolar pode ser reflexo do conhecimento que se está processando, gestando as idéias no silêncio do participante. Às vezes, um toque certo, sutil, leve, uma ancoragem, pode ter boa repercussão e obter bom resultado. Metáfora procedente seria comparar o participante silencioso a um tatu-bola que, ao sentir-se ameaçado, enrosca-se todo, podendo recolher-se e transformar-se em uma bolinha. Se for deixado quieto, de repente, desenvolvese e começa a caminhar de novo. Às vezes, também é necessário um tempo para que o participante possa desenroscar-se.

De acordo com o toque, pode-se levar o participante a enrustir-se mais ou a desabrochar. Nesse sentido, a sensibilidade do professor/tutor/moderador é fundamental, pois intervir pode ser eficiente ou não.

Nessa perspectiva, a condução do silêncio por parte do professor/tutor/moderador constitui aspecto importante a ser considerado. Saber usar o silêncio resulta de um aprendizado difícil, uma vez que o impulso inicial é intervir com freqüência, atendendo à necessidade de aliviar suas próprias tensões. Por vezes, as pessoas, saturadas de suas ansiedades e conflitos, não têm tempo ou espaço para o outro. Todavia, a sabedoria do silêncio e o intervir no momento oportuno podem ser produtivos para o processo do desenvolvimento grupal.

Em toda comunicação há sempre o lado silencioso, que acolhe a palavra do outro. Nem sempre o silêncio reside naquele que aparentemente se cala. A fala verdadeira surge do silêncio. Deve sempre existir o silêncio entre as pessoas: o silêncio de oposição, o silêncio de concentração ou reflexão, o silêncio de ausência ou expectativa, o silêncio que é a condição para que haja comunicação, apenas viabilizada se há alguém que escute. Entre ouvir e escutar pode haver abismos. A pessoa que escuta fica em silêncio, mas é um silêncio produtivo. Um silêncio de acolhimento é o que está disponível para a fala do outro. Existem silêncios tão eloqüentes que o outro acaba percebendo aquilo que o outro está dizendo, ou seja, escuta o que ele está dizendo, diante do seu silêncio acolhedor. É um silêncio de bom ouvinte, ativo, e não um silêncio de ausência.

Torna-se oportuno reforçar a importância de saber ouvir o outro sem estar com ou em silêncio, mas falar escutando, calar para escutar a quem, silencioso, e não silenciado, fala, como bem afirma Freire (2000, p. 132): Quem tem o que dizer deve assumir o dever de motivar, de desafiar quem escuta, no sentido de que, quem escuta diga, fale, responda. [...] Quem escuta sequer tem tempo próprio, pois o tempo de quem escuta é
o seu, o tempo de sua fala. Sua fala, por isso mesmo, se dá num espaço silenciado e não num espaço com ou em silêncio. Ao contrário, o espaço do educador democrático, que aprende a falar escutando, é cortado pelo silêncio intermitente de quem, falando, cala para escutar a quem, silencioso, e não silenciado, fala.

Constata-se, pelo enunciado, a importância do silêncio na comunicação, que possibilita - ao escutar a fala comunicante de outrem como sujeito, e não como objeto - penetrar no âmago do seu pensamento, transformando-o em linguagem. Constata-se, ainda, que viabiliza a quem fala comprometido em comunicar e não em fazer puros comunicados, escutar a indagação, o questionamento, a criação de quem escutou. Ao extrapolar tais condições, inexiste a comunicação.

Tais reflexões levam a repensar o tema do silêncio, uma vez que, no processo da fala e da escuta, a disciplina do silêncio é importante na comunicação dialógica. Saber ouvir e acolher o outro constitui aspecto muito difícil e implica sabedoria. Há muito ainda a pesquisar quanto ao silêncio, cujos estudos e reflexões, certamente, poderão enriquecer a comunicação pedagógica educativa no ciberespaço.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GONÇALVES, M.I.R. Educación en el ciberespacio. Universidad Nacional de Educación a Distancia, Departamento de Didáctica General, Didáticticas Específicas y Organización de las Instituciones Educativas. Madrid, Espanha, 2003. Tese de doutorado.

RHEINGOLD, H. Comunidades virtuais. In: DRUCKER, P.F. A comunidade do futuro: idéias para uma nova comunidade. São Paulo: Futura, 1998. p. 120-127.
RUDIO, F.V. Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na psicoterapia. Petrópolis: Vozes, 1993.

SCHUTZENBERGER, A.A.; WEIL, P. Psicodrama triádico: uma síntese entre Freud, Moreno, Kurt Lewin e outros. Belo Horizonte: Interlivros, 1977.

 

Autor deste artigo: Maria Ilse Rodrigues Gonçalves - participante desde Ter, 31 de Agosto de 2004.

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